2012/06/22

Uma questão de Estado

Gaspar vai avisando, à cautela, que pode não ser possível cumprir a meta do défice para este ano. De imediato temos a reacção de uma data de "dótôres" a explicar o que o ministro quis dizer. Não vá a gente não ter percebido... Mas, a verdade é simples e, como dizia um grande pensador da economia portuguesa, "é fazer as contas..."
Com a actividade económica em queda livre, cujo resultado óbvio e totalmente previsível é a consequente diminuição das respectivas receitas fiscais, e com o aumento brutal dos encargos resultantes da escalada do desemprego, as despesas aumentam para além do limite já anteriormente insuportável, e as receitas diminuem, logo a meta do défice não pode ser cumprida. É assim, simples.
Nem com toda a contabilidade criativa, que o contabilista-mor do reyno entenda instituir, este processo pode ser invertido! Não resta outra alternativa que não seja recorrer aos mesmos aumentando os impostos, i.e, aos mesmos que pagam impostos! É claro como a água.
A solução óbvia pareceria ser então estimular a actividade económica interna (as famosas "exportações", em ascenção há já tanto tempo, não parecem chegar para as encomendas...) e combater o desemprego, o que, por sua vez, pode também ajudar nesse estimulo à actividade económica interna. Mas, nem isso se vislumbra no horizonte político do País.
Nesta corrida louca e totalmente descontrolada os responsáveis não parecem ser capazes de fazer mais do que, como se costuma dizer, empurrar o problema para a fente com a barriga, sem fim à vista nem qualquer meta clara.
Esta política deixa por responder várias questões perturbantes, às quais o douto ministro deveria, com a sobriedade e fina precisão que o caracterizam, responder, sob pena de pensarmos que essa serenidade e aparente rigor não passam de uma enorme encenação.
Responda então o senhor ministro...
Qual a relevância das funções que o Estado desempenha que justificam esta constante insaciabilidade financeira? Que medidas prevê o governo para estancar esta espiral crónica do défice, que corrijam as suas origens, para além de lhes continuar a deitar dinheiro para cima? E, mesmo que consiga equilibrar este défice —com, pelo menos, um estímulo eficaz à economia e o combate ao desemprego—, que legitimidade tem o Estado para se limitar a angariar mais receitas, como se fosse uma mera empresa em busca de manutenção no mercado, em registo de simples sobrevivência, sem rumo, sem estratégia, sem "produto", com prazo de validade confirmado, para vender aos clientes. Ou, no caso de haver "produto", especulando com o preço, valendo-se da posição monopolista para ir buscar umas coroas extra? Que "Estado" é este que os senhores continuam a deixar que se transforme numa simples instituição de prestamistas, comissionistas, especuladores e angariadores de vendas à rasca para arranjar negócio? Que funções deve afinal o Estado exercer e através de quem? Tem o senhor ministro uma ideia clara sobre isso? O que raio andamos nós afinal a pagar, é capaz de nos dizer? Porque nos sai o Estado tão caro, conseguirá explicar? Quem assinou e assina os cheques? É o senhor? É o senhor, senhor ministro da fazenda, que continua a cavar o défice? Qual a sua utilidade então? Para que nos serve, de facto, este Estado, que produziu este défice?

1 comentário:

Rui Mota disse...

Não é só incompetência, é também obsessão. Obsessão pelo controlo do "déficit" e por um modelo de sanemaento das contas públicas para satisfazer as exigências dos credores. Quando terminar este período de intervenção, teremos (teoricamente) pago aos credores, mas estaremos sem dinheiro para reactivar a economia, o que obrigará o governo a pedir um segundo empréstimo. Os juros vão-se acumulando e Portugal continuará "ad-infinitum" a pagar a dívida soberana.
Para além desta obsessão (que só pode conduzir ao desastre), o ministro Gaspar faz ºarte da famosa escola de Chicago (Milton Freedman) e tem um modelo económico que quer aplicar. Se o modelo não se aplica à realidade, muda-se a realidade...