2012/08/26

Ecce Homo

O polémico anúncio da privatização da RTP, a que António Borges chamou eufemisticamente "concessão", não é propriamente surpreendente pela intenção (o governo sempre o anunciou muito claramente desde que tomou posse), mas pelo modelo escolhido. Ao contrário de uma privatização, esta "concessão" pretende vender a RTP em "leasing", oferecendo 200 milhões ao potencial comprador, sem qualquer contrapartida. As contas são fáceis de fazer: o estado garante ao comprador 150 milhões de taxa de utilizador (cobrados através da factura da EDP) mais 50 milhões de publicidade, para cobrir gastos calculados em 180 milhões. Ou seja, o privado que "comprar" a RTP, não só não paga nada pela televisão estatal, como ganha 20 milhões de bónus anualmente, por um período nunca inferior a 20 anos! Dado que o inenarrável Relvas há muito perdeu qualquer réstia de respeitabilidade, Passos mandou o "respeitável" Borges dar a notícia; ou melhor, lançar o "balão de ensaio", sempre conveniente nestas decisões polémicas. António Borges (não confundir com o cavaleiro olímpico do mesmo nome) é também proprietário de uma herdade em Alter do Cháo (a terra do cavalo lusitano), onde acumula com o lugar de presidente da assembleia municipal. Mas, há mais: António Mendo de Castelo-Branco de Amaral Osório Borges (o nome é todo um programa) nasceu em 1949, tendo-se licenciado em Economia em 1972. Mudou-se para os Estados Unidos, em 1976, para fazer o mestrado e, posteriormente, o doutoramento em Stanford (1980). A partir daí, foi sempre a "subir": mudou-se, no mesmo ano, para França, como administrador do INSEAD e regressou a Lisboa para ser vice-governador do Banco de Portugal, entre 1990 e 1993. Novo regresso a França, desta vez como director do INSEAD, em 2000. Mais tarde, tornou-se vice-presidente do conselho administrativo da Goldman & Sachs International, em Londres, onde se manteve até 2008. Passou ainda pelo Citybank, BNP Paribas, Petrogal, Sonae, Jerónimo Martins, Cimpor e Vista Alegre. Foi consultor do Departamento do Tesouro da EUA, da US Electric Power na OCDE e foi colaborador na criação da União Monetária Europeia. Em 2010 foi nomeado director do Departamento Europeu do FMI, onde se manteria até à chegada da senhora Lagarde que, dizem as más-línguas, o teria despedido por não se enquadrar na filosofia da instituição... Em 2011, foi nomeado por Passos Coelho para dirigir a equipa encarregada do dossier das privatizações junto da "troika". Nessa função, têm-se excedido no zelo profissional, não se coibindo em dar opiniões de um verdadeiro governante. Há até que lhe chame o 12º ministro. Em 2011, Borges ganhou 225.000 euros livres de impostos. Ficou célebre pela frase: "Defendo que reduzir salários é uma urgência nacional".

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