2017/11/07

Postais da Holanda (1)

Maria Esmeralda Mendes (1943-2009) era portuguesa e viveu na Holanda, para onde se exilou em 1971. Enfermeira de profissão, foi detida pela PIDE, após ter participado numa greve da classe, no hospital onde trabalhava. Devido às ameaças recebidas, decidiu sair do país, primeiro para Paris e, posteriormente, para Amsterdão, onde acabaria por radicar-se durante 38 anos. 
Durante a permanência na capital holandesa, a sua actividade inicial dividiu-se entre a enfermagem, que exerceu nos primeiros anos de residência e uma activa participação junto da comunidade de portugueses exilados, ao tempo organizados no Comité de Refugiados Portugueses na Holanda.
Após um acidente de trânsito, que a obriga a ficar em casa sem ocupação, redescobre uma antiga paixão pelo desenho e pela pintura, desenvolvida na Escola António Arroio, que chegou a frequentar.
Segue-se um período de grande produção, onde a par da pintura (naíve), desenha e escreve para publicações locais e para Portugal. A sua primeira exposição, tem lugar em 1983, por iniciativa de Vitor da Silva Tavares, editor da & Etc., que publicou igualmente o seu primeiro livro "Rigor Mortis".
Os anos oitenta, são os mais produtivos da sua curta, mas intensa carreira, com inúmeras exposições em galerias e museus na Holanda, Bélgica e Portugal, onde o seu trabalho começa a tornar-se reconhecido. É convidada a ilustrar diversas publicações holandesas e são dela todas as capas de uma série, dedicada a autores portugueses, da editora De Prom. Na mesma época, a prestigiada revista literária holandesa "Maatstaf", dedica-lhe um portofólio, onde sobressai um elogioso texto do escritor, radicado na Holanda, Rentes de Carvalho.
Estamos no início da década de noventa e as suas pinturas (maioritariamente sobre mulheres) tornam-se icónicas e são disputadas por coleccionadores dentro e fora do pais. De novo, a doença, impede o desenvolvimento natural da sua carreira, o que a obriga a reduzir a actividade, assim como o ritmo das exposições. Alarga o campo de interesses e criatividade a outras áreas, como a gravura e a escultura, que desenvolve, a par da pintura, do desenho e da escrita.
Os seus últimos anos, são parcialmente passados em Caminha (Alto Minho), onde se refugia por períodos cada vez mais longos. As suas pinturas reflectem, agora, temas ligados à natureza que a rodeia, iniciando uma nova fase na sua profícua actividade, sem que o traço e a cor percam a força e a coerência. É entrevistada por Maria António Fiadeiro para o JL, que com ela realiza um documentário televisivo e colabora com a escritora Luísa da Costa, para quem ilustra o livro "Os Magos".
Na área do teatro, colabora na feitura dos cenários da peça "Ensaio Geral" (Horovitz) levada à cena pela Companhia do Chiado, em finais dos anos noventa.
Todas estas informações e muitas outras, foram este ano publicadas em livro por Dirk Baartse, seu companheiro ao longo de 38 anos, autor do texto e da composição gráfica de "Maria Mendes, uma biografia", em edição bi-lingue, cuja tradução portuguesa esteve a cargo de Rui Mota.
O livro foi, recentemente, apresentado na Biblioteca do Complexo De Hallen, em Amsterdão, perante uma assistência maioritariamente composta por amigos holandeses e portugueses da pintora. A organização esteve mais uma vez a cargo da agência Q-Arts (Teresa Pinto) e contou igualmente com a presença do prof. Fernando Venâncio, que faria uma comunicação sobre "Autores e rivalidades na literatura portuguesa, ao longo da História", para além da projecção do filme "Sonhar não custa dinheiro", um docu-drama sobre mulheres portuguesas (e.o. Maria Mendes) na Holanda.
Uma sessão evocativa, que justificou a viagem a um passado recente, numa cidade onde tivemos o privilégio de conhecer e conviver com a homenageada. A memória, também se faz destas coisas.

 
 

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