Aqui há uns anos uma canção chamada "Tourada" venceu o Festival da Canção RTP. Estávamos em período pré-25 de Abril. A canção falava de peões de brega "cuja profissão não pega." Este verso motivou um comunicado irado de um até então desconhecido "Sindicato dos Toureiros". Num período em que os sindicatos eram calados à força, o comunicado deste "sindicato", com largas e conhecidas tradições na luta sindical (!), motivou ampla campanha e mereceu grande cobertura dos jornais. De tão ridícula a situação foi alvo, num primeiro tempo, de uma enorme chacota, para logo a seguir ter merecidamente caído num total esquecimento. Naquele tempo as pessoas estavam mesmo mais atentas e aparentavam ter uma maior noção do ridículo.
Não sei porquê, lembrei-me de tudo isto a propósito dos actuais casos das declarações do ministro Lino ou dos comentários do professor Charrua...
O certo é que enquanto a malta anda toda distraída com estas momentosas e graves questões e assiste à mobilização por parte dos partidos de toda a artilharia pesada de que dispõem para lidar com este assunto, o governo acaba de fazer aprovar, de forma discreta e invocando habilmente larga soma de motivos virtuosos, uma proposta para criação de uma base de dados de ADN. Que me lembre esta questão, gravíssima, não mereceu nunca qualquer espécie de debate, nem foi nunca discutida na imprensa.
Os portugueses conhecem hoje bem o deserto do Poceirão e o Charrua da DREN, mas desconhecem inteiramente as consequências que para si e para os seus descendentes pode ter este projecto da base de dados de ADN e os problemas que gerou noutros países. As seguradoras e as famacêuticas (como pagar os 719 milhões que o Estado lhes deve...?), essas, já devem estar, entretanto, a esfregar as mãos de contentes.
ADN... mmm, mas que raio é isso? Um novo partido? Uma marca de desodorizante? Ou será a sigla da empresa de desinfecção que nos vai livrar de toda a poluição social...?
Ó Mendes! Ó Sousa! Ó Chico! Tragam aí mais mísseis!!!
6 comentários:
O DNA (Data Afastada do Nascimento) é, para a maioria da população, sinónimo de PDI. De facto, o ADN é uma matéria discutida noutros países, pelos motivos que se adivinham. Mas quem é que se preocupa com tais "minudezas" num país de iletrados? Voltamos à questão de fundo: em Portugal não há cultura de cidadania devido à falta de tradição democrática e ao medo que, pouco a pouco, está a voltar à sociedade portuguesa. Quando o governo é de maioria, a tentação de controlar torna-se uma vertigem. Os governos do centrão (PS/PSD) usam e abusam desta insuportável forma de pressão (veja-se o caso da DREN) e, o que é pior, a maioria dos portugueses aceita-a. Uma questão genética, diria eu...
Cá para mim a culpa é da entrada do dinheiro fácil da Comunidade Europeia. Só depois é que se manifestou a tal "questão genética": ficou-se a saber que os nossos genes são mais próximos dos da cigarra que dos da formiga.
Até ao dia em que venham os patrões estrangeiros pôr a malta toda a trabalhar para eles...
Pois é, esses argumentos todos poderão ser válidos. Mas não nos podemos afastar do essencial...
Há ausências graves nesta discussão do projecto da base de dados de ADN. Ou melhor (reescrevo a frase): há uma ausência de discussão que me parece totalmente inexplicável.
Não é só o povo iletrado e "acigarrado" que está ausente deste debate. A maior parte das pessoas desconhece efectivamente as consequências de tudo isto. Mas, há por aí forças políticas que deveriam ter vergonha de não terem forçado o debate em torno desta questão. Andam a dormir?
É fácil transformar, como se vê, um problema de caca numa obsessão nacional. Deverá ser fácil transformar um problema grave como é este da base de dados de ADN em objecto de verdadeira discussão.
A preocupação expressa neste post vem somar-se à que Pacheco Pereira (de quem tantas vezes discordo, mas que quanto à atenção que dá à questão da liberdade individual e ao seu controlo por parte dos poderes públicos merece todos os encómios) vem relevando em diversos escritos, dos quais menciono o que publicou no Público de 25/5, aqui transcrito e comentado: http://abrupto.blogspot.com/2007/05/uma-vida-uma-ficha-joo-silva-e-mulher.html
É um tema de importância crucial, a que os cidadãos parecem não dar a devida importância. Ponhamo-nos a pau!
A preocupação expressa neste post vem somar-se à que Pacheco Pereira (de quem tantas vezes discordo, mas que quanto à atenção que dá à questão da liberdade individual e ao seu controlo por parte dos poderes públicos merece todos os encómios) vem relevando em diversos escritos, dos quais menciono o que publicou no Público de 25/5, aqui transcrito e comentado: http://abrupto.blogspot.com/2007/05/uma-vida-uma-ficha-joo-silva-e-mulher.html
É um tema de importância crucial, a que os cidadãos parecem não dar a devida importância. Ponhamo-nos a pau!
Pacheco Pereira tem telhados de vidro (há uns anos atrás, quando era deputado, tentou proibir os jornalistas na Assembleia da República e sempre apoiou as missões de espionagem americanas para defender a civilização ocidental do terrorismo). No entanto, tem escrito - e muito - sobre o assunto. O mesmo se passa, de resto, com Vasco Pulido Valente. É a vantagem de haver pensadores de direita que pensam pela própria cabeça e não estão comprometidos com os aparelhos partidários.
O problema, em sociedades como a portuguesa, é existir uma população adormecida que, ainda por cima, está pauperizada e tem medo de protestar, para não perder o emprego.
Veja-se o exemplo do Bilhete de Identidade actual. Ainda mantém dados como o estado civil (desnecessário) e a impressão digital (uma herança do fascismo!). Na maior parte dos países que conheço, o BI não tem nem um dado, nem outro. Há países (Holanda) onde nem sequer é obrigatório ter BI. Basta a carta de condução ou o passaporte.
Por causa dos dados identificadores da população holandesa, é que os nazis descobriram quem eram os judeus. Só em Amsterdão, foram mortos 30.000, numa população de 40.000. No total, morreram mais de 100.000 judeus holandeses, nos campos de exterminação alemães. Razão: nas fichas de cidadãos, existentes no Registo Civil, os judeus eram indicados pelo código "J" (J queria dizer "jood" = judeu).
Claro que os holandeses aprenderam e hoje existe um movimento cívico importante que se opõe a este tipo de controlo. Mas, não tenhamos ilusões:
A informatização veio tornar as coisas mais fáceis para controlar os cidadãos. Em Portugal chama-se "simplex". Quando este falha, há sempre um "bufo" de serviço para acabar o trabalhinho. Sempre são 48 anos de experiência, não é verdade?...
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