Uma crónica de hoje de António Barreto no Público suscita-me algumas reflexões. Devo, desde logo, confessar que concordo, em traços gerais, com a sua substância. Quatro quintos da sua crónica dedica-os Barreto a zurzir no governo por causa da sua alegada "tentativa visível e crescente de tomar conta, orientar e vigiar." Governo que, acrescenta Barreto, "quer saber tudo sobre todos. Quer controlar."
Na origem de tudo isto está uma mal disfarçada necessidade de afirmação de autoridade que se exerce recorrendo a métodos criticáveis.
Numa rápida enumeração destes métodos Barreto cita a lei das chefias da administração pública, o bilhete de identidade "quase único", a criação de um órgão de coordenação das polícias, debaixo do controlo directo do primeiro-ministro, a revisão e reforma do estatuto do jornalista e da Entidade Reguladora para a Comunicação, a lista pública dos nomes de parte dos incumpridores fiscais, o apelo à delação de funcionários, a criação de um ficheiro dos funcionários públicos "com cruzamento de todas as informações relativas a esses cidadãos, incluindo pormenores da vida privada dos próprios e dos seus filhos," e, finalmente, o processo movido por Sócrates contra um bloguista que, há anos, levantou a questão dos "diplomas" universitários do primeiro-ministro. Acrescentaria eu a esta lista a famosa base de dados de ADN, que ainda vai dar que falar...
No quinto final da sua crónica Barreto chama, justamente, a atenção para o facto de praticamente toda a imprensa ter dado enorme destaque à acusação, feita ao "professor de Sócrates," de corrupção e branqueamento de capitais, no caso da construção de uma estação de tratamento de lixo na Cova da Beira. Barreto faz muito justamente notar que "quando as redacções dos jornais não resistem à demagogia velhaca e sensacionalista, quase dão razão a quem pretende colocá-las sob tutela..."
O que nesta crónica, quase sem mácula, se poderia criticar é a proporção na distribuição dos alvos. Sejamos justos: os jornais merecem, pelo menos, tanta crítica quanto o governo. As malfeitorias e os malefícios da actividade de uns e de outros equivalem-se.
Terão passado despercebidas as palavras recentes de Noronha da Costa. Disse o Presidente do STJ que "na verdade, o mercado do lucro colocou a comunicação social entre Cila e Caríbdis, o que nos reconduz à ideia de que a ética bem pouco importa, quando importa garantir a sobrevivência que só o lucro concede."
Quem controla o quê, para quê e em nome de quem, afinal?
2 comentários:
Watch out Carlos: Big Brother is reading you!
Hope so... :-)!!!
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