O "Plano Inclinado" foi suspenso. Não é um programa que se veja de forma neutra, os seus actores não são neutros, o que dizem não é neutro, o próprio aparecimento do programa na grelha da SIC N não terá sido neutro. Revejo-me em muitas opiniões ali emitidas, não me revejo noutras. Há milhentas razões para concordar e outras tantas para discordar daquilo que ali é dito. Ouvimos os seus intervenientes, questionamos o que dizem, tentamos aferir a sua coerência e fazemos a nossa avaliação.
Acontecerá certamente isso com todos os espectadores. E porquê? É o conceito do programa que o dita. Quem fala é responsável pelo que diz e quem ouve é responsável pelas conclusões que tira. O "Plano Inclinado" é uma introdução à cidadania. Diz-nos enquanto decorre e eu digo-o depois de a ele assistir: "somos todos responsáveis! Haja ferramentas..."
A minha avaliação pessoal sobre o programa nem sequer é positiva. Considero que muitos intervenientes ficam claramente aquém do seu papel e da sua crítica, por exemplo. Mas prezo bastante o facto de que, em geral, não se colocam tão pouco além do seu papel e da sua crítica.
E prezo, sobretudo, o respeito que o conceito do programa revela pela capacidade de ser eu a decidir o que penso de tudo aquilo. O respeito pela inteligência dos outros não é um valor muito estimado em Portugal e isso reflecte-se na televisão portuguesa. Se fosse, um programa que pratica o respeito não seria exemplo praticamente único, inserido na grelha de um canal temático, emitido a horas tardias.
Não sei porquê, ao assistir a certos episódios mais contundentes, daqueles em que se punham nomes aos bois e aos boys, pensava para com os meus botões que poderíamos estar perante um exemplo de que afinal alguma coisa mudou de facto em Portugal. A denúncia pública dos responsáveis pelos problemas do país, feita de forma sistemática e sustentada, é possível sem que estes ou as forças obscuras que os comandam caiam na tentação de intervir. O tique inquisitorial ou pidesco poderiam estar a desvanecer-se finalmente. Desvanecer não é desaparecer, mas, pensei muitas vezes, pode ser, insh'Allah, um sinal de que algo está a mudar.
Ao mesmo tempo, confesso-o, também me perguntava como e se um programa destes iria resistir. Se vencesse o teste do tempo, então sim, estaríamos perante um sinal inequívoco de que algo mudou de facto. O teste do tempo provaria que um programa deste género pode esgotar-se e desaparecer naturalmente com o tempo, por causa das suas fraquezas próprias, mas nunca, fora de tempo, pela tentação da intervenção totalitária.
Ficamos então a saber que o programa foi suspenso, sem data de regresso, para "repensar" o conceito... Não resistiu ao teste do tempo.
4 comentários:
O "Plano inclinado" era bastante descaído para a ...direita.
Raras foram as opiniões contrárias às de Medina Carreira, que era o único convidado permanente.
Não me parece que tenhamos perdido grande coisa. Afinal, já todos sabíamos as opiniões do Carreira, que era apoiado pelo Duque, que era apoiado pelo Cantigas, que era apoiado pelo Crato, que era apoiado pela Mónica. Quanto economistas de esquerda passaram pelo programa? Não me lembro de nenhum.
Pois, mas de direita ou de esquerda (a coisa é complicada...) prefiro ser eu a decidir se vejo ou não vejo, se ouço ou não ouço as opiniões dos outros. Talvez o programa tenha deixado de servir algum frete. Imagino o que seria quando o Carreira começasse a atirar-se contra o Passos Coelho!
Eu até nem tinha boa opinião sobre o programa como escrevi no post, mas preferia ser eu a desligar o aparelho...
O Paulo Querido perguntava mesmo agora no Twitter "Mário Crespo já mandou fazer a camiseta a dizer que foi censurado na SIC-N?"
Aguardamos, ansiososamente, a resposta...
Já agora, para quem não tenha visto a edição que ditou o dobrar a finados do "Plano Inclinado", está aqui.
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