Sobre a expressão "Verão Índio" reza a lenda que, as tribos norte-americanas, acreditavam que o sangue dos ursos mortos, depois de encharcar a terra, alimentava as raízes das árvores, cujas folhas se tornavam vermelhas nesta época do ano. Será esta a razão, pela qual as florestas ganham novas cores, quando se aproxima o fim de Setembro... Nunca saberemos se assim é, até porque os ursos rareiam, mas a imagem é bonita e não custa nada a acreditar.
Neste Verão prolongado, em que se transformou o Outono português, continuam os incêndios e as vítimas por afogamento, uma vez que os organismos, que deviam zelar pela segurança dos cidadãos, partem do princípio que as respectivas épocas (dos fogos e a balnear) terminaram no dia 21 de Setembro. Vá lá convencê-los do contrário...
Para já, o Outono promete ser quente, não só pelas condições climatéricas adversas, como pelos factos políticos que se adivinham.
1) O primeiro facto, decorre dos recentes resultados eleitorais, e tem a ver com a remodelação à direita, que promete ser "animada". Depois da copiosa derrota de Passos Coelho, pouco mais restava ao ex-primeiro ministro (e ainda actual líder do PSD) do que retirar-se, enquanto espera por uma sinecura numa qualquer administração privada. Entretanto, no partido, começou a "contagem das espingardas", perfilando-se dois candidatos para o lugar: Rui Rio, ex-autarca do Porto e eterno candidato ao lugar de secretário-geral (associado a uma tendência mais social-democrata); e Pedro Santana Lopes, ex-autarca de Lisboa e ex-primeiro-ministro (associado a uma tendência mais liberal e populista). Teoricamente poderão aparecer mais candidatos, mas ninguém duvida que será entre estes dois representantes, do Partido fundado por Sá Carneiro, que irá disputar-se o lugar de secretário-geral. Quem ganhar, irá defrontar António Costa em 2019, ainda que ninguém acredite que o PSD-PPD possa voltar ao governo antes de 2023. Uma longa travessia do deserto, que poderá durar seis anos...
Já à esquerda, a quebra (inesperada) da CDU, em 10 das câmaras onde normalmente governava, veio pôr a nú uma divisão existente entre os apoiantes da "geringonça" e os seus adversários, que defendem um endurecimento das negociações e um regresso às greves, anunciadas em sectores vitais como a saúde, os transportes e a educação. Também nesta área, o Outono será certamente quente.
2) O segundo facto, prende-se com a situação na vizinha Espanha, onde o referendo catalão fez reacender demónios, que ciclicamente regressam, para lembrar que a dominação castelhana continua a não ser aceite por diversas regiões espanholas. Esta é uma situação recorrente, onde líderes nacionalistas e populistas, aproveitam para fortalecer as suas ambições pessoais. Estamos perante duas posições, aparentemente irrevogáveis, em que Puigdemont e Rajoy, deixaram de escutar-se e falam apenas para os seus seguidores. Um diálogo de surdos, durante o qual o rei espanhol, com o seu discurso inóquo e algo pífio, não contribuiu para uma solução mais duradoura e pacífica. O aparente recuo de Puigdemont, ao pronunciar a independência e a adiá-la na mesma sessão do Senado, só aparentemente foi uma derrota. Deu um passo atrás, que pode bem significar dois à frente, em futuro referendo e negociações. Para já, nada terminou e a independência da Catalunha continua na agenda.
3) Finalmente, a acusação do MP, hoje tornada conhecida, contra vinte e oito personalidades da nossa praça, entre os quais José Sócrates e Ricardo Salgado (os mais famosos) por crimes de corrupção activa e passiva, para além de lavagem de dinheiro e fuga ao fisco, num mega processo que se arrasta há 4 anos. Terminado o processo de instrução, segue-se agora uma nova fase, durante a qual os arguidos poderão requerer (ou não) a abertura do processo, após o que este seguirá para julgamento que se prevê longo e complexo. De acordo com os especialistas e dada a extensão deste caso (116 volumes com um total de 4000 páginas) e mais de 700 testemunhas arroladas, não será de esperar um julgamento na 1ª instância antes de finais de 2019, muito provavelmente só em 2020...
Uma verdadeira "saga" que promete tornar-se uma novela, a acompanhar durante os próximos verões, com ou sem índios, desta vez. Os "ursos", como já adivinharam, serão os do costume...
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