Sem surpresa, foram desmanteladas duas milícias neonazis nos últimos dias, que integravam agentes das forças de segurança nas suas hostes.
A Comunicação Social refere uma obscura organização que dá pelo nome de Movimento Armilar Lusitano (MAL) que incluía 4 agentes, entre duas dezenas de pessoas sinalizadas pela polícia. "O MAL é descrito como sendo uma milícia armada, com suspeitas de actividades terroristas, discriminação e incitamento ao ódio e à violência. Na operação da Unidade Nacional de Contra-Terrorismo (UNCT) foram apreendidos explosivos, armas brancas e armas de fogo, Foram ainda encontradas armas desenhadas em impressoras 3D com capacidade para disparar, algo inédito em Portugal" (in "Público" d.d. 19 de Junho). Dos planos apreendidos, constava um assalto ao parlamento, ao palácio presidencial e ataques a diversas personalidades políticas.
O que é que isto nos diz? Provavelmente, que a ideologia e métodos fascistas, não sendo de hoje, existem há muito na sociedade, aguardando uma oportunidade para actuar. A chegada de um partido fascista ao parlamento em 2019, deu-lhes a confiança necessária para se mostrarem e exibirem a violência e o ódio que sempre os caracterizam. A violência é a principal característica do fascismo.
Só que, estas coisas não surgem do vácuo (como diria o outro) tendo causas mais profundas. Uma delas é a herança da ditadura, longa de 50 anos, para além da ignorância que continua a influenciar grandes estratos da população. De acordo com dados recentes, a iliteracia funcional entre os portugueses é de 42% (in "Observador" d.d.18/12/24). Ou seja, cerca de metade da população, não entende o que lê. Este dado vale o que vale, mas não deve ser menosprezado.
Como explicar o nível de abstenção crescente (um dos mais altos da Europa) nas eleições em Portugal? Ou a pouca participação cívica dos portugueses em assuntos nacionais e internacionais? Não há cidadania, e este é um problema cultural que influencia todo o resto.
Durante muito tempo, as forças democráticas, que emergiram após o 25 de Abril, dominaram a arena política e pensou-se que bastava votar de quatro em quatro anos e descer anualmente a Avenida da Liberdade, para garantir a Democracia. Os fundos europeus de coesão alimentaram essa ideia e as gerações, que fizeram o "25 de Abril", reformaram-se, passando a "participar" na política através da televisão. O "sofá" substituiu a democracia participativa. A posterior liberalização de costumes e a cultura do consumismo, criou a ideia, numa certa classe média, de que já éramos europeus, porque já podíamos comprar tudo como na Europa. Ter ou não ter "roupa de marca", substituiu a "luta de classes". Naomi Klein, socióloga e activista canadiana, escreveu um livro seminal sobre esta questão (No Logo).
Só que...os tempos e os contextos mudam. A crise do "crédito fácil" (subprime) em 2008, foi o primeiro sinal de alarme a afectar todo Mundo Ocidental. Seguiu-se a crise das "dívidas soberanas", das quais Portugal é um caso paradigmático (com a intervenção da Troika em 2011) e, mais tarde, a crise pandémica, terminada em 2021. Ainda mal refeitos do vírus, e quando tudo parecia acalmado, começou uma guerra que criou mais inflação, o que hoje afecta toda a população. Se é assim em países mais desenvolvidos, porque seria diferente em Portugal, um dos elos fracos desta corrente?
É neste contexto, que os portugueses mais desfavorecidos, com ou sem razão, procuram uma alternativa ao pântano actual. Esta é, certamente, uma das explicações para os votos no partido populista, cuja única actividade conhecida é a denúncia de um "sistema" que corrói a República.
Só que, esta constatação, não explica tudo. Concorreram às últimas eleições cerca de 20 partidos. Porque é que podendo votar num partido fora do "arco da governação", 1,5 milhões de portugueses optaram pelo pior deles todos? Hoje, 40% dos jovens, entre 18 e 34 anos, dizem apoiar o "Chega". Alguma coisa está mal na sociedade e não são apenas as questões sócio-económicas que as explicam.
Não partilho da opinião que são todos "coitadinhos" e devemos tentar entender as razões deste voto de "protesto", contra o "sistema". Mas, qual sistema, se a "seita", que dá pelo nome de Chega, outra coisa não deseja do que fazer parte do sistema que criticam? Penso que existe muito "paternalismo", de uma certa esquerda, nesta observação, que procura justificar os seus erros, com uma entidade (o povo) que terá sempre razão (!?). Não é verdade. Quando os nazis cometeram os crimes que conhecemos, a maioria da população alemã apoiou-os. Mais tarde, quando interrogados, diziam que não sabiam...
É por isso, que o aparecimento de milícias neonazis, apoiantes da ideologia do partido fascista no parlamento, não deve constituir uma surpresa. Antes, um aviso, para o que aí vem. Não aprender com a História, pode revelar-se fatal. Quem adormece em democracia, pode acordar em ditadura.
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