2011/03/23

Ditadura de pantufas (2)



Não pode deixar de chocar a pressão que os políticos e comentadores de serviço do regime exercem sobre os portugueses. Pais, mães, tios, tias e primos da democracia portuguesa, todos opinam. Afinando as gargantas e com mais ou menos variações recomendam, instam, urgem em coro os partidos a estabelecer alianças para a salvação da república neste momento de crise.
Mas, quem é que, na perspectiva desta "família democrática", claramente disfuncional, entra na aliança? Que partidos? Ora, o PS, o PSD e o CDS, pois claro, os tais partidos auto-designados do "arco do poder", os mesmos que, enquanto "arco do poder" e com o poder de definir o arco, deixaram o país neste estado e repetem repetem agora incessantemente que as outras forças presentes na AR, mesmo que representando uma percentagem significativa da população, têm o poder de se auto-excluir desse arco.
"O próximo governo vai exigir mais do que a vontade de um partido", diz um. "Há mais a unir estes partidos [euro, Europa, economia de mercado] do que a dividi-los", justifica outro.
Não creio que os milhares e milhares que desfilaram nas manifestações dos passados dias 12 e 19 tão pouco se revejam nesta lógica do "arco do poder".
O que podem os Portugueses esperar pois para afastar os efeitos da crise? Mais controlo sobre a dívida? Mais medidas para transformar a economia e combater a pior recessão deste Portugal do século XXI? Não creio. O que os partidos do "arco do poder" parecem vir fazendo há anos é arranjar maneiras de se perpetuarem no poder. Amanhando-se sozinhos à vez, ou amanhando-se colectivamente quando a solução individual se revela desajustada como agora.
A resolução dos problemas do país fica para um dia (como se prova com o agravamento contínuo e prolongado dos problemas estruturais). Quando muito, podemos ir esperando que sejam atamancados para efeitos de manutenção do poder.  
A democracia portuguesa parece uma daquelas lojas em cujas prateleiras vemos uma limitadíssima selecção de produtos, maus e caros.
O país está assim dependente do sucesso dos efeitos desta lógica de intoxicação do sentido crítico dos portugueses. Só poderemos exultar com as eleições quando tivermos a certeza que os nossos compatriotas estão imunes a estas tentativas de intoxicação.

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