2012/12/04

NOTAS DE VIAGEM: no meio da “crise” holandesa

Nada como sairmos da pátria para ver as coisas em perspectiva. Os dias passados entre Paris e Amsterdão, deram-nos uma imagem, necessariamente impressionista, que ajuda a relativizar lugares-comuns. Parece ser oficial: a crise chegou aos Países-Baixos, bastião de austeridade e rigor orçamental, onde a frugalidade e a poupança, mais do que conceitos, são um “modo de vida”. O que, até há pouco era um problema exclusivo de países periféricos, como Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha (vulgo PIIGS), parece ter-se alastrado ao núcleo duro do “marco” de que fazem parte a Alemanha, a Holanda, a Áustria ou a Finlândia.
Depois de longos meses de formação, o novo governo holandês – uma coligação de liberais de direita e sociais-democratas – tomou posse no passado mês de Outubro. Confrontada com a crise da “zona euro” e a relativa estagnação do crescimento económico (causa do aumento do desemprego e dos subsídios sociais daí inerentes), a coligação governamental anunciou na passada semana um novo pacote de medidas de austeridade: corte de 16 mil milhões de euros no orçamento para 2013, com especial incidência nos rendimentos mais baixos, nas prestações sociais (com excepção das reformas), na educação, na saúde e na cultura. Simultaneamente, foi anunciada uma nova grelha fiscal (5 escalões) e aumentada a percentagem do IRS e do seguro de saúde obrigatório.  Onde é que já vimos este filme?
De acordo com  o “De Volkskrant” do passado dia 29,  a desigualdade de rendimentos será maior em 2013. Os grupos de rendimentos mais baixos (entre €500 e €1200 brutos) verão os seus rendimentos descer cerca de 2%, enquanto um trabalhador que ganhe uma vez e meia o ordenado médio nacional (€3.819,45 brutos) verá o seu vencimento aumentar em 2%.  Simultaneamente, o ordenado mínimo nacional (€1.456,20 brutos) será aumentado em 0,13% (€1,62 mensais em termos líquidos).
Ao contrário da classe média portuguesa, a classe média holandesa é a mais beneficiada deste novo escalonamento fiscal, o que não deixa de ser surpreendente. A razão desta medida, é explicada pela violenta reacção deste grupo, após o anúncio do acordo governamental de Outubro, que previa um aumento substancial do imposto do seguro de saúde (obrigatório na Holanda) para os maiores rendimentos. Essa receita extra reverteria para os mais desfavorecidos que, dessa forma, não veriam os seus seguros de saúde aumentados. Com a nova grelha fiscal, os mais desfavorecidos, não só verão o seu seguro de saúde (€150 mensais em média) aumentado, como verão os seus vencimentos diminuídos.
Outro dos ministérios mais afectados será o da Ajuda ao Desenvolvimento, onde estão previstos cortes no valor de mil milhões de euros até 2017. Será uma diminuição progressiva (cerca de 200 milhões anuais), mas representativa da tendência actual na sociedade holandesa, agora mais sensível aos discursos da direita que defende cortes nos apoios a estrangeiros dentro e fora do pais.
Aparentemente isentos neste pacote de austeridade, parecem estar os reformados mais pobres que, até ver, mantêm as suas pensões congeladas. Isto, até ao dia 1 de Março. Nessa data, será feita uma avaliação das provisões do Fundo Nacional de Pensões e, caso estas estejam abaixo do previsto, poderão haver cortes até 3% do rendimento.

2 comentários:

Carlos A. Augusto disse...

A aproximação norte-sul não parece ficar por aí, a julgar pelo que se passou no campo do Buitenboys...

Rui Mota disse...

Pois não. Esta de jogadores matarem um arbitrário (na Holanda!) não lembrava ao "careca". O Mundo está, de facto, mais perigoso.