O que têm as manifestações de Istambul, Ancara, Cairo, Alexandria, S. Paulo ou do Rio de Janeiro, em comum?
Aparentemente, nada.
Na Turquia, o que começou por ser a ocupação pacífica de uma das praças mais emblemáticas de Istambul - contra planos urbanísticos que punham em causa um parque na cidade - tornou-se uma gigantesca onda de protesto nacional contra o governo de Erdogan e as suas politicas de islamização da sociedade turca, um estado formalmente laico desde os anos vinte do século passado. Mais do que os ocupantes da praça Taksim, os cidadãos de dezenas de outras cidades turcas que aderiram ao protesto, lutam agora por uma Turquia moderna e democrática, onde questões como a educação, o emprego e o meio-ambiente, passaram a estar na ordem do dia.
No Egipto, dois anos depois dos protestos da praça Tahir - que estiveram na origem da queda do governo de Mubarak - os habitantes do Cairo voltaram à rua, desta vez para exigirem a demissão do governo do presidente Morsi, acusado de manipulação dos resultados eleitorais que lhe deram a vitória há um ano atrás e da crescente islamização da sociedade egípcia desde que a Irmandade Muçulmana ascendeu ao poder. Também aqui os jovens da praça Tahir exigem democracia, educação e emprego.
Finalmente, o que começou por ser um protesto dos habitantes de S. Paulo - contra o aumento das tarifas dos transportes da cidade – alastrou a dezenas de cidades brasileiras, agora já não apenas contra os preços dos bilhetes, mas por melhores transportes, melhores escolas e melhores hospitais, exigências num pais democrático, onde 1/3 da população continua a não ter acesso a uma vida decente. Isto, ao mesmo tempo que o governo brasileiro gasta centenas de milhões de euros na organização de eventos desportivos para glorificação da suas classes dirigentes.
Alguma coisa está a passar-se em países e sociedades tão diversas, onde, há relativamente pouco tempo, as populações pareciam mergulhadas numa apatia geral, certamente explicadas pelos regimes de “democracia musculada” em que viviam, ou, na alternativa brasileira, numa bolha de crescimento económico, que se revelou artificial.
Se há um denominador comum em todos estes protestos, este deve ser procurado na recusa das novas gerações em aceitar regimes autoritários e corruptos, que mais não fazem do que reproduzir os modelos dos governos que eles próprios derrubaram, com a promessa de que, a partir de agora, tudo seria diferente,. Não foi. Não é. É isso que estes jovens, muitos deles educados, mas desempregados e sem futuro em sociedades onde a população jovem é maioritária, já perceberam. E porque deixaram de acreditar e não têm tempo para construir um futuro diferente, mais não lhes resta do que protestar. Para já, de forma espontânea e, aparentemente, desorganizada, mas com a coragem que exigem os grandes momentos. E este é, ainda que pelas piores razões, um importante momento histórico. O que se está a passar na Turquia, no Egipto ou no Brasil, apesar das suas diferenças, pode afinal estar bem mais perto do que as distancias geográficas fazem crer.
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