Aqui há uns anos uma canção chamada "Tourada" venceu o Festival da Canção RTP. Estávamos em período pré-25 de Abril. A canção falava de peões de brega "cuja profissão não pega." Este verso motivou um comunicado irado de um até então desconhecido "Sindicato dos Toureiros". Num período em que os sindicatos eram calados à força, o comunicado deste "sindicato", com largas e conhecidas tradições na luta sindical (!), motivou ampla campanha e mereceu grande cobertura dos jornais. De tão ridícula a situação foi alvo, num primeiro tempo, de uma enorme chacota, para logo a seguir ter merecidamente caído num total esquecimento. Naquele tempo as pessoas estavam mesmo mais atentas e aparentavam ter uma maior noção do ridículo.
Não sei porquê, lembrei-me de tudo isto a propósito dos actuais casos das declarações do ministro Lino ou dos comentários do professor Charrua...
O certo é que enquanto a malta anda toda distraída com estas momentosas e graves questões e assiste à mobilização por parte dos partidos de toda a artilharia pesada de que dispõem para lidar com este assunto, o governo acaba de fazer aprovar, de forma discreta e invocando habilmente larga soma de motivos virtuosos, uma proposta para criação de uma base de dados de ADN. Que me lembre esta questão, gravíssima, não mereceu nunca qualquer espécie de debate, nem foi nunca discutida na imprensa.
Os portugueses conhecem hoje bem o deserto do Poceirão e o Charrua da DREN, mas desconhecem inteiramente as consequências que para si e para os seus descendentes pode ter este projecto da base de dados de ADN e os problemas que gerou noutros países. As seguradoras e as famacêuticas (como pagar os 719 milhões que o Estado lhes deve...?), essas, já devem estar, entretanto, a esfregar as mãos de contentes.
ADN... mmm, mas que raio é isso? Um novo partido? Uma marca de desodorizante? Ou será a sigla da empresa de desinfecção que nos vai livrar de toda a poluição social...?
Ó Mendes! Ó Sousa! Ó Chico! Tragam aí mais mísseis!!!
2007/05/25
2007/05/24
jamais
Há ministros que, se não existissem, tinham de ser inventados. Por exemplo, Manuel Pinho, Isabel Pires de Lima, Jaime Silva e, tantos outros, também de outros governos, de quem já nem me lembro o nome...Mário Lino, pertence certamente a esta galeria de carácteres notáveis. Que seria do "Contra Informação" ou do "Inimigo Público", sem eles?
As últimas declarações do ministro das obras públicas, sobre a localização do novo aeroporto, são de espantar! Não sei se hei-de rir, se hei-de chorar...
Viajante assíduo de avião e, por isso, de aeroportos, fico sempre espantado com as opiniões definitivas dos nossos governantes sobre tal matéria: desde os delirantes louvores à Portela, que já não pode crescer para lado nenhum e representa um perigo acrescido em termos ambientais e acidentes aéreos imprevisíveis; até à OTA (custe o que custar) porque já não há tempo a perder (para quem?), todos os argumentos parecem válidos. No Sul, é que não! Porquê? Porque todos os especialistas (todos?) dizem que no Sul, "jamais" (em francês).
Ora, como sabemos, "jamais" em francês, tem muito mais força do que jamais (nunca, em tempo nenhum, principalmente), em português. É difícil combater este argumento linguístico.
E porque é que o aeroporto não pode ser a Sul do Tejo (quereria o ministro dizer Alentejo)?. Porque lá, nada medra. Veja-se a agricultura: não tiveram os alentejanos de vender os "montes" aos lisboetas e emigrar para Lisboa? Veja-se o Alqueva: não foi lá construído o maior lago artificial da Europa para regadio e afinal só lá andam barcos? Veja-se o porto de Sines: não é que, entretanto, acabaram os petroleiros de grande calado? Veja-se a base de Beja: então não é que só lá podem trabalhar chineses?. Aquela terra está amaldiçoada, Ali, nada dá. Nunca. "Jamais" (em francês).
Eu não sei se a OTA é pior ou melhor local para construir um aeroporto. O senso comum diz-me que não. Mas de uma coisa eu desconfio: é da pressa em construir o aeroporto na OTA. Hoje, até o presidente do partido no governo veio dizer que um aeroporto na margem Sul era um perigo, pois se os terroristas dinamitassem uma das pontes sobre o Tejo, o aeroporto ficava isolado do Mundo. Extraordinário!
Lê-se, ouve-se e não se acredita. Alguém era capaz de comprar um carro em segunda-mão a esta gente? Eu, jamais...
As últimas declarações do ministro das obras públicas, sobre a localização do novo aeroporto, são de espantar! Não sei se hei-de rir, se hei-de chorar...
Viajante assíduo de avião e, por isso, de aeroportos, fico sempre espantado com as opiniões definitivas dos nossos governantes sobre tal matéria: desde os delirantes louvores à Portela, que já não pode crescer para lado nenhum e representa um perigo acrescido em termos ambientais e acidentes aéreos imprevisíveis; até à OTA (custe o que custar) porque já não há tempo a perder (para quem?), todos os argumentos parecem válidos. No Sul, é que não! Porquê? Porque todos os especialistas (todos?) dizem que no Sul, "jamais" (em francês).
Ora, como sabemos, "jamais" em francês, tem muito mais força do que jamais (nunca, em tempo nenhum, principalmente), em português. É difícil combater este argumento linguístico.
E porque é que o aeroporto não pode ser a Sul do Tejo (quereria o ministro dizer Alentejo)?. Porque lá, nada medra. Veja-se a agricultura: não tiveram os alentejanos de vender os "montes" aos lisboetas e emigrar para Lisboa? Veja-se o Alqueva: não foi lá construído o maior lago artificial da Europa para regadio e afinal só lá andam barcos? Veja-se o porto de Sines: não é que, entretanto, acabaram os petroleiros de grande calado? Veja-se a base de Beja: então não é que só lá podem trabalhar chineses?. Aquela terra está amaldiçoada, Ali, nada dá. Nunca. "Jamais" (em francês).
Eu não sei se a OTA é pior ou melhor local para construir um aeroporto. O senso comum diz-me que não. Mas de uma coisa eu desconfio: é da pressa em construir o aeroporto na OTA. Hoje, até o presidente do partido no governo veio dizer que um aeroporto na margem Sul era um perigo, pois se os terroristas dinamitassem uma das pontes sobre o Tejo, o aeroporto ficava isolado do Mundo. Extraordinário!
Lê-se, ouve-se e não se acredita. Alguém era capaz de comprar um carro em segunda-mão a esta gente? Eu, jamais...
citação do dia
Com agradecimentos a A Causa Foi Modificada
«Se o PSD tivesse um mínimo de vergonha na cara e algum vestígio de respeito pelos eleitores de Lisboa que nele votaram nas passadas eleições, reuniria toda a direcção política para uma conferência de imprensa às oito da noite, e anunciaria a decisão de se abster de apresentar um candidato às próximas eleições autárquicas, pedia desculpas aos lisboetas pelo sucedido nos últimos não sei bem quantos anos e prometia gastar os próximos a pensar numa estratégia e num candidato de qualidade para Lisboa.»
«Se o PSD tivesse um mínimo de vergonha na cara e algum vestígio de respeito pelos eleitores de Lisboa que nele votaram nas passadas eleições, reuniria toda a direcção política para uma conferência de imprensa às oito da noite, e anunciaria a decisão de se abster de apresentar um candidato às próximas eleições autárquicas, pedia desculpas aos lisboetas pelo sucedido nos últimos não sei bem quantos anos e prometia gastar os próximos a pensar numa estratégia e num candidato de qualidade para Lisboa.»
2007/05/23
Espantosa Itália
Espantosa Itália, sempre no limiar da ingovernabilidade, porém sempre recomposta. Universo político de que não estão nunca ausentes jogos florentinos de poder com tons de "commedia dell'arte". É a Itália que se traduz muitas vezes ainda na expressiva fórmula do velho dirigente socialista Pietro Nenni (1891-1980) : país onde "tutto vive, niente funziona". Ora, nesta espantosa e única Itália, o "Partito Democratico" em constituição, no qual convergem personalidades do centro-direita e do centro-esquerda, toma como modelo o partido homónimo estado-unidense e pretende-se de inspiração kennedyana (seja lá o que isso for nos dias de hoje...). E o comité constituinte, que conduzirá este embrião de partido até 14 de Outubro, data da realização da assembleia contituinte, integra nada mais nada menos que 45 membros. É já apelidado, pois, de "il comitatone". Pressagiam algumas más- línguas, como o mordaz humorista Michele Serra, do "La Repubblica", que o primeiro congresso da novel organização será - evidentemente - o da respectiva dissolução. Veremos ("staremo a vedere") ...
os pequenos sinais
O processo disciplinar recentemente imposto a um professor, por alegada anedota sobre o primeiro-ministro, é em si uma anedota, mas revela outra coisa mais grave: a intolerância persecutória de uma coordenadora do ensino, no seguimento de uma denúncia, à boa maneira dos "bufos" do antigo regime.
Não devemos admirar-nos. Depois da proposta-lei, sobre avaliações na função pública, que aceita denúncias de mau desempenho, como critério de avaliação, tudo pode acontecer. A começar pela denúncia dos colegas que querem ver-se livres dos competidores mais competentes na sua área. Sei do que falo e por isso o denuncio.
Curioso (ou talvez não) é estas leis serem propostas pelo Partido Socialista. Não é a primeira vez e, creio, não será a última. Começou, ainda num passado não muito distante, por uma proposta da (então) deputada Jamila Madeira que sugeria a criação de um bilhete de identidade que incluisse dados do ADN do portador (tão nova e já tão perversa!). Seguiu-se a famigerada "Lei de Escutas", proposta por António Costa que (oh, ironia do destino!) lhe havia de cair em cima. Já mais recentemente, a criação do "Cartão Único" (5 em 1), apresentado pelo "iluminado Sócrates", como o suprasumo do facilitismo tecnológico. A recente lei de avaliação da função pública é, até ver, a "cereja em cima do bolo".
No campo cultural, a "coisa" fia mais fino, mas o dirigismo e o provincianismo estão lá também: nomeação de Carlos Fragateiro para o D. Maria II, despedimento de Pinamonti no S. Carlos, compra em "comodato" (gosto desta palavra) da mais do que discutível colecção do "comendador" Berardo, que será sempre o seu dono e ainda receberá dinheiro do MC para actualizá-la, etc...
São pequenos sinais e, provavelmente, apenas coincidências. Mas como eu não acredito em bruxas, há que estar atento. Como dizia o poeta russo: "ontem foram os comunistas, hoje os estrangeiros, amanhã serás tu. Nessa altura, será tarde, pois ninguém te ajudará".
Não devemos admirar-nos. Depois da proposta-lei, sobre avaliações na função pública, que aceita denúncias de mau desempenho, como critério de avaliação, tudo pode acontecer. A começar pela denúncia dos colegas que querem ver-se livres dos competidores mais competentes na sua área. Sei do que falo e por isso o denuncio.
Curioso (ou talvez não) é estas leis serem propostas pelo Partido Socialista. Não é a primeira vez e, creio, não será a última. Começou, ainda num passado não muito distante, por uma proposta da (então) deputada Jamila Madeira que sugeria a criação de um bilhete de identidade que incluisse dados do ADN do portador (tão nova e já tão perversa!). Seguiu-se a famigerada "Lei de Escutas", proposta por António Costa que (oh, ironia do destino!) lhe havia de cair em cima. Já mais recentemente, a criação do "Cartão Único" (5 em 1), apresentado pelo "iluminado Sócrates", como o suprasumo do facilitismo tecnológico. A recente lei de avaliação da função pública é, até ver, a "cereja em cima do bolo".
No campo cultural, a "coisa" fia mais fino, mas o dirigismo e o provincianismo estão lá também: nomeação de Carlos Fragateiro para o D. Maria II, despedimento de Pinamonti no S. Carlos, compra em "comodato" (gosto desta palavra) da mais do que discutível colecção do "comendador" Berardo, que será sempre o seu dono e ainda receberá dinheiro do MC para actualizá-la, etc...
São pequenos sinais e, provavelmente, apenas coincidências. Mas como eu não acredito em bruxas, há que estar atento. Como dizia o poeta russo: "ontem foram os comunistas, hoje os estrangeiros, amanhã serás tu. Nessa altura, será tarde, pois ninguém te ajudará".
Novo tipo de roubo

Está em preparação, segundo dizem os jornais hoje, um novo tipo de roubo nas caixas multibanco. Desta feita, porém, em vez da habitual ameaça com a seringa ou da extracção da caixa de multibanco com um tractor, o método e o autor são diferentes. Agora são os próprios bancos que pretendem cobrar operações que são executadas pelos seus clientes, usando uma rede --que é propriedade de um consórcio que envolve todos os bancos--, criada como alternativa aos dispendiosos balcões. Em vez de uma agência, com funcionários, mobiliário, equipamento, papel, etc, somos brindados com um PC ligado em rede, à chuva ou ao sol, sem interior design, nem uma plantinha para decoração. E este PC que nos colocam à disposição nem sequer dá para jogar um Solitaire enquanto trabalhamos...
Podemos facilmente imaginar que, se esta rede não existisse, os bancos se veriam forçados a admitir os funcionários necessários para levar a cabo essas operações que agora somos nós que executamos, a dar-lhes formação e a aumentar as suas infraestruturas proporcionalmente.
Não quero acreditar que isto seja verdade, mas se for vou voltar ao cheque, ao talão de depósito, etc. E vou voltar a frequentar novamente os bancos por dá cá aquela palha, podem disso ter a certeza. Ah! e se algum funcionário me quiser vir explicar como posso executar a mesma operação no multibanco peço o Livro de Reclamações!
Resta saber o que pensa sobre tudo isto o senhor primeiro ministro, que se mostrou no passado tão sensível em relação a estas questões do direito dos consumidores...
2007/05/16
Lusofonias
Uma das palavras mais fascinantes do vocabulário recente do país é a palavra "lusofonia". Por dá cá aquela palha lá vem ela. Ele é o Encontro das universidades lusófonas que vai ser promovido em Cabo Verde, ele é a Cena Lusófona que aparenta estar a perder as pilhas, ele foi uma recente Primeira Bienal da Lusofonia organizada pela Malaposta. Enfim, a "lusofonia" é palavra que se ouve e é conceito, aparentemente, celebrado todos os dias, de uma forma ou de outra.
Digo aparentemente porque, vistas todas estas iniciativas, ficamos com a sensação que "lusofonia" não passa de um chavão, sem outro objectivo que não seja o de promover umas reuniõezecas inócuas. Ficamos muitas vezes persuadidos que ninguém quer, de facto, fazer nada para tornar a Lusofonia uma realidade, e que, pelo contrário, se procura projectar esta imagem de criança hiperactiva para que as coisas fiquem sempre, assim, num limbo calmo, caloroso e conveniente. (O "limbo" foi oficialmente extinto, eu sei... Mas, como diria um grande pensador do futebol português, "vocês sabem do que estou a falar...").
Lusofonia arrisca-se a ser um daqueles conceitos relativamente ao qual se pode aplicar aquele célebre comentário de Gandhi a propósito da civilização ocidental: "era uma boa ideia!"
Banalizado, esvaziado de conteúdo e, sobretudo, destituído de um suporte sério, político e financeiro, a Lusofonia parece, por vezes, mais um pretexto para uns quantos amigalhaços irem comendo umas "cachupas" ou umas "moambas" juntos do que um conceito mobilizador e útil para todos os povos que integram este espaço.
A menos que... Bom, a menos que um desses novos países de expressão oficial portuguesa tome a iniciativa e lance verdadeiramente mãos à obra! Ou que esses novos países decidam definitivamente habitar uma outra língua e nos deixem a falar sózinhos...
Digo aparentemente porque, vistas todas estas iniciativas, ficamos com a sensação que "lusofonia" não passa de um chavão, sem outro objectivo que não seja o de promover umas reuniõezecas inócuas. Ficamos muitas vezes persuadidos que ninguém quer, de facto, fazer nada para tornar a Lusofonia uma realidade, e que, pelo contrário, se procura projectar esta imagem de criança hiperactiva para que as coisas fiquem sempre, assim, num limbo calmo, caloroso e conveniente. (O "limbo" foi oficialmente extinto, eu sei... Mas, como diria um grande pensador do futebol português, "vocês sabem do que estou a falar...").
Lusofonia arrisca-se a ser um daqueles conceitos relativamente ao qual se pode aplicar aquele célebre comentário de Gandhi a propósito da civilização ocidental: "era uma boa ideia!"
Banalizado, esvaziado de conteúdo e, sobretudo, destituído de um suporte sério, político e financeiro, a Lusofonia parece, por vezes, mais um pretexto para uns quantos amigalhaços irem comendo umas "cachupas" ou umas "moambas" juntos do que um conceito mobilizador e útil para todos os povos que integram este espaço.
A menos que... Bom, a menos que um desses novos países de expressão oficial portuguesa tome a iniciativa e lance verdadeiramente mãos à obra! Ou que esses novos países decidam definitivamente habitar uma outra língua e nos deixem a falar sózinhos...
2007/05/13
Rigor e vulnerabilidade
A utilização dos computadores veio revolucionar o nosso quotidiano, mas, ao mesmo tempo, veio trazer também muitos motivos de ansiedade. Eu, pelo menos, fico exasperado com o "modo de pensar" dos computadores e com algumas exigências dos seus procedimentos e detecto isso nalguns utilizadores que observo.
Há duas causas para esta reacção.
Por um lado, os computadores e respectivos softwares revelam uma total intolerância em relação aos erros e às imprecisões. Escrever "faceocultadaterra.blogspot.com" para aceder a este blogue não é, nem de perto nem de longe, o mesmo que escrever "faceoclutadaterra.blogspot.com". O erro, que para nós seria facilmente ultrapassável, constitui para um computador e para os softwares que o governam uma barreira intransponível. "Blog does not exist!" declara peremptório! Pior ainda: imaginamos que o computador e os seus softwares "aprendem" o nome mil vezes escrito e que basta escrever "face" para ele automaticamente aceder ao endereço correcto. É verdade. Mas, o endereço incorrecto também ficou guardado na "memória" da criatura e lá voltamos nós, sem apelo, ao erro, à crescente frustração e à ansiedade.
Por outro lado, este universo das redes de computadores é o das identidades secretas, dos "usernames", das "passwords", dos "perfis", das privacidades e dos códigos secretos! Sem estabelecermos um perfil, sem criarmos um username e uma password adequada, este universo está-nos completamente vedado. A imprecisão na inserção dos "usernames" e das "passwords", então essa é fatal: Access denied! Operation timed out! Connection cancelled! Contact the webmaster! Process terminated!, sentencia sem piedade...
Se pensarmos nisto como uma forma de preservar a nossa identidade neste frágil universo digital e de estarmos defendidos, a ideia parece reconfortante. Porém, todos os indícios parecem mostrar que nunca estivemos tão expostos e que nunca fomos tão vulneráveis. Todo o código é decifrável, não há passwords invioláveis e não estamos digitalmente seguros em lado nenhum. Aqui andamos todos nus. A nossa persona electrónica, o nosso íntimo digital, todos os nossos dados circulam por aí, neste grande caldeirão que é a internet, ao alcance de todos.
Não se trata de dar voz a nenhum alarmismo, daqueles que os jornais gostam muito de escarrapachar nas primeiras páginas. Nada disso! Até porque nós temos sempre, de facto, a possibilidade de criar uma identidade digital com um raio de acção curto... O que quero dizer é que existem inúmeros alçapões e corredores secretos e que, em consequência, o assédio nunca foi tão fácil (pensem, por exemplo, nas toneladas de junk mail que todos os dias recebemos, até aqui no endereço do Face...). Este assédio só é possível porque invadir os terrenos da nossa privacidade digital é, efectivamente, canja.
Por um lado, portanto, estamos presos nesta teia digital e nela temos de adoptar um comportamento rigoroso senão não somos ninguém. Por outro lado, todo o fruto deste nosso rigor anda por aí, à solta, e é de quem o apanhar...
Há duas causas para esta reacção.
Por um lado, os computadores e respectivos softwares revelam uma total intolerância em relação aos erros e às imprecisões. Escrever "faceocultadaterra.blogspot.com" para aceder a este blogue não é, nem de perto nem de longe, o mesmo que escrever "faceoclutadaterra.blogspot.com". O erro, que para nós seria facilmente ultrapassável, constitui para um computador e para os softwares que o governam uma barreira intransponível. "Blog does not exist!" declara peremptório! Pior ainda: imaginamos que o computador e os seus softwares "aprendem" o nome mil vezes escrito e que basta escrever "face" para ele automaticamente aceder ao endereço correcto. É verdade. Mas, o endereço incorrecto também ficou guardado na "memória" da criatura e lá voltamos nós, sem apelo, ao erro, à crescente frustração e à ansiedade.
Por outro lado, este universo das redes de computadores é o das identidades secretas, dos "usernames", das "passwords", dos "perfis", das privacidades e dos códigos secretos! Sem estabelecermos um perfil, sem criarmos um username e uma password adequada, este universo está-nos completamente vedado. A imprecisão na inserção dos "usernames" e das "passwords", então essa é fatal: Access denied! Operation timed out! Connection cancelled! Contact the webmaster! Process terminated!, sentencia sem piedade...
Se pensarmos nisto como uma forma de preservar a nossa identidade neste frágil universo digital e de estarmos defendidos, a ideia parece reconfortante. Porém, todos os indícios parecem mostrar que nunca estivemos tão expostos e que nunca fomos tão vulneráveis. Todo o código é decifrável, não há passwords invioláveis e não estamos digitalmente seguros em lado nenhum. Aqui andamos todos nus. A nossa persona electrónica, o nosso íntimo digital, todos os nossos dados circulam por aí, neste grande caldeirão que é a internet, ao alcance de todos.
Não se trata de dar voz a nenhum alarmismo, daqueles que os jornais gostam muito de escarrapachar nas primeiras páginas. Nada disso! Até porque nós temos sempre, de facto, a possibilidade de criar uma identidade digital com um raio de acção curto... O que quero dizer é que existem inúmeros alçapões e corredores secretos e que, em consequência, o assédio nunca foi tão fácil (pensem, por exemplo, nas toneladas de junk mail que todos os dias recebemos, até aqui no endereço do Face...). Este assédio só é possível porque invadir os terrenos da nossa privacidade digital é, efectivamente, canja.
Por um lado, portanto, estamos presos nesta teia digital e nela temos de adoptar um comportamento rigoroso senão não somos ninguém. Por outro lado, todo o fruto deste nosso rigor anda por aí, à solta, e é de quem o apanhar...
2007/05/10
Mais do mesmo?
A actual governação da Câmara Muncipal de Lisboa foi, finalmente, dissolvida. Uma boa notícia. Também foram anunciadas as eleições intercalares, que terão de decorrer no prazo de sessenta dias. Até aqui tudo bem.
Curiosamente - ou talvez não - os primeiros candidatos a apresentarem a sua disponibilidade, foram dois "independentes" (o que quer que isso signifique): Carmona Rodrigues, o engenheiro destituido e Helena Roseta, a arquitecta demissionária. Uma confirmação e uma surpresa. Nenhum deles parece ser um "peso pesado" e, sem os aparelhos partidários a apoiá-los, dificilmente conseguirão atingir os seus objectivos. Os partidos de "esquerda" irão, ao que tudo indica, separados e, os da "direita", também. Se, aos nomes conhecidos (Rúben de Carvalho pelo PCP e José Sá Fernandes pelo BE) juntarmos o dos candidatos do PS e do PSD (por anunciar) são já seis os potenciais candidatos. Ainda falta um candidato do CDS e já é conhecida a vontade de Fontão de Carvalho (ex-vereador) e de Manuel Monteiro (PND) em participar no escrutínio. E vão nove! Daqui até ao fim do prazo, para apresentar as candidaturas, mais candidatos reais ou virtuais vão aparecer. É bom haver tanta escolha. Não nos parece que algum deles tenha qualquer hipótese. Quando aparecerem os nomes dos partidos maiores (PS e PSD) perceberemos melhor quem tem mais possibilidades. O problema é que são estes partidos os principais culpados da "bagunça" em que se tornou Lisboa. Os lisboetas têm aqui uma boa oportunidade de inverter o rumo das coisas. Caso isso não aconteça, arriscamo-nos a ter mais do mesmo na martirizada capital do país.
Curiosamente - ou talvez não - os primeiros candidatos a apresentarem a sua disponibilidade, foram dois "independentes" (o que quer que isso signifique): Carmona Rodrigues, o engenheiro destituido e Helena Roseta, a arquitecta demissionária. Uma confirmação e uma surpresa. Nenhum deles parece ser um "peso pesado" e, sem os aparelhos partidários a apoiá-los, dificilmente conseguirão atingir os seus objectivos. Os partidos de "esquerda" irão, ao que tudo indica, separados e, os da "direita", também. Se, aos nomes conhecidos (Rúben de Carvalho pelo PCP e José Sá Fernandes pelo BE) juntarmos o dos candidatos do PS e do PSD (por anunciar) são já seis os potenciais candidatos. Ainda falta um candidato do CDS e já é conhecida a vontade de Fontão de Carvalho (ex-vereador) e de Manuel Monteiro (PND) em participar no escrutínio. E vão nove! Daqui até ao fim do prazo, para apresentar as candidaturas, mais candidatos reais ou virtuais vão aparecer. É bom haver tanta escolha. Não nos parece que algum deles tenha qualquer hipótese. Quando aparecerem os nomes dos partidos maiores (PS e PSD) perceberemos melhor quem tem mais possibilidades. O problema é que são estes partidos os principais culpados da "bagunça" em que se tornou Lisboa. Os lisboetas têm aqui uma boa oportunidade de inverter o rumo das coisas. Caso isso não aconteça, arriscamo-nos a ter mais do mesmo na martirizada capital do país.
Fait-divers antixenófobo
Vá lá mais uma pequena achega contra a xenofobia, suscitada por um brevíssimo diálogo ao balcão nesta Lisboa que está a ser de novo a "das muitas e desvairadas gentes". A empregada brasileira, ainda jovem, em comentário às trivialidades sobre os caprichos do tempo, afirmou que o clima já não era como antigamente, pois passámos em escassos dias do Inverno para o Verão, sem experimentar a Primavera. Achei delicioso este "já não é como antigamente", proferido com a naturalidade de quem se sente de aqui, como se aqui tivesse nascido ou aqui vivesse há longos anos. E isto fez-me sorrir e sentir como esta terra pode e deve acolher mais imigrantes (criando condições dignas para tal, evidentemente), em reforço da ideia que a miscigenação, a mestiçagem foi e continuará a ser um dos trunfos genéticos - muitas vezes esquecido - deste país . Bem-vindos, pois! Quanto a essa rapaziada que por aí anda com ideias rapadas e cruz gamada tatuada no corpo e no paupérrimo espírito, boa viagem até, por exemplo, à Antárctida, sem ofensa para os que lá trabalham sazonalmente e para os animais que lá vivem...
2007/05/04
Câmara Obscura
O folhetim da Câmara Municipal de Lisboa tornou-se a nova novela da política portuguesa. Na boa tradição dos seriados brasileiros, fica sempre algo por esclarecer de episódio para episódio. Há que manter o "suspense", para prender o espectador aos telejornais. Estes, como sabemos, podem ser diários, de hora a hora ou (se a notícia assim o exige) de "última hora". Qual será o desfecho, amanhã? Teremos novo anúncio de Carmona, agora demitindo-se de vez? Ou teremos mais manifestações de solidariedade para com um presidente que perdeu a confiança política do partido que o apoiou? Haverá eleições? Daqui a quarenta ou a sessenta dias? Quem são os candidatos? Os mesmos de sempre, ou outros, "independentes" e "novinhos" em folha? Perguntas cruciais, como se percebe, agora que alguns dos casos mais mediáticos dos últimos meses vão perdendo a actualidade. Já que não há "notícias boas", ao menos que haja "más notícias". Infelizmente, a questão da CML não se reduz a Carmona ser pouco hábil ou não. Já toda a gente percebeu que não é. Será, quanto muito, um homem sério e um bom engenheiro, o que já não é pouco. Mas, a questão principal, não reside no homem. Vem de longe e tem fama como o célebre "brandy". Há quantos anos é que Lisboa não é bem governada? Esta é a questão e por alguma razão o passivo da Câmara ultrapassa hoje o milhão de euros... Também por isso (mas não só) os partidos da oposição não desejam eleições. Eles sabem (melhor o PS e o PCP) que o problema não é o actual presidente da Câmara. Ele é apenas a face de um "sistema" que elimina liminarmente todos aqueles que não jogam a seu favor. Que os lisboetas sejam também utilizados neste jogo sujo, é deplorável. Que mais iremos ouvir nos próximos dias? A seguir com atenção, como todas as novelas...
2007/05/03
Campeonato Nacional da Língua Portuguesa (CNLP) e barbaridades
O CNLP é uma organização lúdico-cultural que se inspira numa boa causa e apresenta inegáveis méritos. Porém, não podem nem devem ser escamoteados os aspectos negativos que tem revelado e que haverá todo o interesse em eliminar em futuras edições. Por exemplo : 1 . O carácter altamente polémico do critério de correcção de algumas questões dos testes de qualificação. 2. A existência de erros de português na redacção do articulado do próprio regulamento do concurso. Estes foram entretanto corrigidos na quase totalidade, após alerta lançado por alguns concorrentes. 3 . As falhas, silabadas, erros cometidos na última fase da final - a das perguntas-respostas orais - por parte da apresentadora (cuja telegenia e esforço de bem fazer as coisas são inquestionáveis, mas insuficientes). 4 . Questionários também eles inquinados e, por conseguinte, geradores de confusão para os concorrentes, agravando assim as derrapagens da apresentadora. Ora, tudo isto denota uma certa superficialidade na elaboração das provas e no respectivo controlo, que não se coaduna com a pomposidade de que esta competição faz alarde. Onde acaba o desleixo e começa a incompetência ? Quero agora referir tão-só dois exemplos, entre vários outros significativos, que se impõem por escandalosos e, creio, com influência no resultado final do recente CNLP : 1.º Foi perguntado a um dos concorrentes seniores qual a função sintáctica de "amor eterno" na frase "os namorados (ou os apaixonados) prometeram-se amor eterno". O concorrente respondeu, e bem, "complemento directo", mas a resposta considerada correcta era..."complemento indirecto"(!). 2.º A concorrente sénior vencedora respondeu erradamente a uma das últimas perguntas. O termo era "inconsútil", que significa "sem costuras". Pois bem, quer a resposta dada quer a "oficial" apontaram para "sem consumo"(!). É, pois, de todo desejável que esta competição não se deixe subjugar por vícios decorrentes do seu formato demasiado tributário da lógica mediática imperante - a da espectacularidade , com os seus corolários de frivolidade e laxismo -, em prejuízo do rigor e da profundidade que a matéria em causa merece e exige.
2007/04/30
Um quadradinho de verde na aldeia de Telheiras

Dinamizadora desse grupo (segundo outros intervenientes na sessão de lançamento, nunca a ART teve tanto dinamismo como quando ela foi sua presidente), a autora, sendo socióloga, foi levada a interessar-se também pelo «significado sociológico do caso e a agir como investigadora».
O «objectivo de estudo que deu origem a este livro» foi «perceber de que forma uma acção colectiva, baseada num entendimento partilhado sobre o uso de uma parcela de território de um bairro -- no caso concreto, o bairro de Telheiras, em Lisboa -- pode ser entendida como uma aprendizagem ambiental».
Este livro situa-se definitivamente de fora da mainstream das cabeças pensantes e dos opinion makers, a qual se pauta pela realpolitik: «É no quadro de uma teoria da acção e do sujeito permitindo a utopia pragmática, o realismo utópico, que este trabalho académico se filia». "Fora de moda", como se vê, o que interessa a Ana Contumélias é saber «em que medida vivências ligadas ao território geram e activam identidades colectivas locais (...) resultantes do sentido de pertença, construídas através da apropriação quotidiana da cidade, do bairro, da praça ou do jardim». Há a consciência de que estamos «num tempo em que aprendemos a desconfiar das Grandes Utopias (...) mas se pressente que os espaços locais podem ser o lugar certo para o germinar das pequenas, mas mobilizadoras utopias».
A utopia confrontou-se com a realidade dos poderes e da burocracia. Tenho a convicção de que um dia «a noção de humanidade como um todo ganhará nova acuidade e sentido» e «o civismo tornar-se-á fundamentalmente um civismo ecológico»; mas eu vou esperar sentado, para não me cansar muito. É que estou convencido de que gestos como estes estão bem à frente do seu tempo.
Os habitantes mais antigos de Telheiras ainda dizem "vou a Lisboa", quando se deslocam ao centro da cidade e as dezenas de pessoas que se inscreveram como desejando ser jardineiros/horticultores ainda lá moram, em Telheiras.
Também ainda lá está, sem que a comunidade o utilize, o quadradinho verde, terreno passível de ser utilizado pelos "jardineiros/moradores de Telheiras". Surpresa seria se um dia eles ganhassem o direito de ali fazer hortas. A lógica de desenvolvimento da cidade é a do negócio imobiliário que não se compadece com utopias.
No entanto, como dizia Sartre em Maio de 1968 e Ana cita, é preciso "alargar o campo do possível"; estas acções, se outro efeito não tiverem, terão certamente o da experiência de intervenção cívica que conferem aos intervenientes.
Um dia iremos acordar ajoujados ao peso de uma cidade inumana em que nos habituámos a viver, e vamos querer vizinhos, e amigos, e fruição, e convívio; e exigiremos intervalos na sucessão de prédios para podermos cultivar as nossas hortas. Só nessa altura estaremos à altura de ser verdadeiros jardineiros ou horticultores.
A parte mesmo boa deste caso é o conforto que podemos retirar de saber que ainda existem pessoas como Ana Contumélias; pessoas com quem o futuro é possível.
Um quadradinho de verde na aldeia de Telheiras, de Ana Contumélias, Plátano Editora
2007/04/26
Memorizar
Como manda a tradição, o Presidente discursou na Assembleia. Disse ele, entre outras coisas, que "é tempo de (re)avaliar a cerimónia" e que "o futuro pertence aos jovens". O discurso do Presidente vale o que vale e cada um extrairá dele as conclusões que melhor entender.
Que a cerimónia da Assembleia cheira um bocado a mofo, todos estamos de acordo. Que o futuro pertence aos jovens, nem se discute. Resta saber, como manter a memória, após trinta e três anos de comemorações.
E é aqui que bate o ponto: sem educação cívica digna desse nome, difícil será a um jovem compreender o regime que ninguém (à excepção de alguns saudosistas) quer ver de volta. Eu não quero e, estou certo, o Professor Cavaco também não. Portanto, há que repensar o ensino da democracia, com o risco de sermos obrigados a ver cerimónias destas até ao fim dos nossos dias... Ora a melhor forma de manter viva a memória - coisa com que os portugueses convivem mal - é ensinar nas escolas o que era o regime ditatorial e o que significou o "25 de Abril", por oposição aquele. A avaliar pelos programas curriculares conhecidos (onde a História ensinada termina, muitas vezes, em 1820) dificilmente os jovens, de que o falava o Professor, entenderão o que se passou. Como também sabemos, o futuro pertencerá aos jovens que melhor compreendam o passado. Quanto mais não seja, para não repetirem os seus erros.
Que a cerimónia da Assembleia cheira um bocado a mofo, todos estamos de acordo. Que o futuro pertence aos jovens, nem se discute. Resta saber, como manter a memória, após trinta e três anos de comemorações.
E é aqui que bate o ponto: sem educação cívica digna desse nome, difícil será a um jovem compreender o regime que ninguém (à excepção de alguns saudosistas) quer ver de volta. Eu não quero e, estou certo, o Professor Cavaco também não. Portanto, há que repensar o ensino da democracia, com o risco de sermos obrigados a ver cerimónias destas até ao fim dos nossos dias... Ora a melhor forma de manter viva a memória - coisa com que os portugueses convivem mal - é ensinar nas escolas o que era o regime ditatorial e o que significou o "25 de Abril", por oposição aquele. A avaliar pelos programas curriculares conhecidos (onde a História ensinada termina, muitas vezes, em 1820) dificilmente os jovens, de que o falava o Professor, entenderão o que se passou. Como também sabemos, o futuro pertencerá aos jovens que melhor compreendam o passado. Quanto mais não seja, para não repetirem os seus erros.
2007/04/23
Afinal há mesmo alternativas!
Num post anterior disse que o papel da imprensa no chamado caso Sócrates tem sido inqualificável. E acrescentei que nenhum orgão de informação, por uma razão ou outra, sai limpo de tudo isto. Falo, claro está, como observador de todas estas coisas, baseado apenas na minha reflexão.
Hoje tivemos a oportunidade de pressentir novos contornos em todo este processo e de encontrar novos motivos de reflexão. O presidente do PSD foi à Ota dizer que o projecto tem de parar e aponta alternativas concretas. Reparem: não diz que é preciso estudar alternativas, aponta-as!
Sabemos que há apenas um argumento no discurso oficial que tem sido repetidamente usado, que todos aceitam ou se vêem obrigados a aceitar. É um único argumento que parece em todo este caso verdadeiramente inatacável no plano político: o governo analisou e decidiu. Ora o presidente do PSD vem agora dizer que não há demostração de capacidade de decisão, há teimosia.
Desgastado o primeiro ministro com o complexo problema do Inglês Técnico, vai-se preparando a opinião pública --que no fundo nunca entenderá cabalmente a verdadeira dimensão de tudo isto e que nunca será, por mais debates públicos que se façam sobre esta matéria, o agente final da decisão-- para a ideia de que estamos perante um capricho, ainda por cima, de uma pessoa sem carácter... Afinal sempre existiram outras possibilidades, o "sem carácter" é que não deixa!
É o primeiro passo para queimar a opção Ota e para fazer o que no fundo parece ter sido a única motivação de todo este imbróglio, ou seja, mandar o novo aeroporto para outros territórios que servem outros interesses. Estes assuntos, cheira-me, não andam desligados...
Talvez isto explique as alianças e as guerras, quem se revela a favor e quem se revela contra, quem move todos os meios para atacar e quem move todos os meios para defender o primeiro ministro. E isto talvez explique também o timing de toda esta operação.
Afinal o papel da imprensa pode não ter sido tão inocentemente miserável como pareceu. Pode, pelo contrário, ter sido mesmo miseravelmente miserável.
Para que conste, não estou aqui a fazer o panegírico do primeiro ministro, que nem sequer me agrada especialmente. Estou apenas a pensar alto...
Hoje tivemos a oportunidade de pressentir novos contornos em todo este processo e de encontrar novos motivos de reflexão. O presidente do PSD foi à Ota dizer que o projecto tem de parar e aponta alternativas concretas. Reparem: não diz que é preciso estudar alternativas, aponta-as!
Sabemos que há apenas um argumento no discurso oficial que tem sido repetidamente usado, que todos aceitam ou se vêem obrigados a aceitar. É um único argumento que parece em todo este caso verdadeiramente inatacável no plano político: o governo analisou e decidiu. Ora o presidente do PSD vem agora dizer que não há demostração de capacidade de decisão, há teimosia.
Desgastado o primeiro ministro com o complexo problema do Inglês Técnico, vai-se preparando a opinião pública --que no fundo nunca entenderá cabalmente a verdadeira dimensão de tudo isto e que nunca será, por mais debates públicos que se façam sobre esta matéria, o agente final da decisão-- para a ideia de que estamos perante um capricho, ainda por cima, de uma pessoa sem carácter... Afinal sempre existiram outras possibilidades, o "sem carácter" é que não deixa!
É o primeiro passo para queimar a opção Ota e para fazer o que no fundo parece ter sido a única motivação de todo este imbróglio, ou seja, mandar o novo aeroporto para outros territórios que servem outros interesses. Estes assuntos, cheira-me, não andam desligados...
Talvez isto explique as alianças e as guerras, quem se revela a favor e quem se revela contra, quem move todos os meios para atacar e quem move todos os meios para defender o primeiro ministro. E isto talvez explique também o timing de toda esta operação.
Afinal o papel da imprensa pode não ter sido tão inocentemente miserável como pareceu. Pode, pelo contrário, ter sido mesmo miseravelmente miserável.
Para que conste, não estou aqui a fazer o panegírico do primeiro ministro, que nem sequer me agrada especialmente. Estou apenas a pensar alto...
2007/04/19
representatividades (2)
O fenómeno não é novo e muito menos original. Quando a economia cresce, há pouco desemprego e é necessária mão-de-obra (de preferência barata) contratam-se trabalhadores estrangeiros para suprir as faltas do mercado. Quando a economia estagna, as obras param e as empresas deslocam as fábricas para outras paragens, fica o desemprego. Com este cresce a exclusão e a marginalidade social. Com a marginalidade aumentam a agressividade e a violência gratuitas, normalmente dirigidas contra os mais fracos da sociedade. Há que encontrar um "bode expiatório" para as nossas frustrações. Os estrangeiros são sempre mais apetecíveis. Se a estes factores, já de si explosivos, juntarmos a ignorância, o racismo e o fundamentalismo, com raízes na Inquisição e no Fascismo que atravessaram a maior parte dos últimos quatrocentos anos em Portugal, temos reunidos os condimentos necessários para explicar o actual surto de xenofobia. Já vimos este filme em qualquer lado e nem sempre acabou bem. A recente detenção de membros de um partido, que perfilha ostensivamente o ideário nazi, pode ser visto como uma prevenção, mas não é em si uma segurança. Melhor seria não existirem. Uma vez que existem, não resultará proibi-los. Mas convém monotorizá-los. Para não dizermos, depois, que não sabíamos...
2007/04/18
Ainda o Campeonato da Língua Portuguesa
Ex.ma Comissão Técnico-Científica do Júri Nacional do Campeonato Nacional da Língua Portuguesa,
Sinto-me como aquele sujeito que, tendo sido uns meses antes sodomizado por um gorila, respondendo à pergunta sobre se estava magoado, se queixava: "Claro que estou magoado; ele nem sequer se dignou mandar-me um postalzinho!"
De facto, essa douta Comissão não achou por bem responder aos argumentos que evoquei quanto a algumas respostas não coincidentes com as correcções aos testes do Campeonato, que enviei em sucessivas mensagens por correio electrónico e que dou aqui por reproduzidas.
Como não me conformo com essa ausência de respostas, tomo agora a liberdade de alvitrar, eu próprio, uma resposta possível às questões que coloquei, colocando-me na pele dessa douta Comissão.
Ex.mo concorrente
Pedimos desculpa pelo facto de só agora respondermos às questões que colocou, mas, como verá, tal não tem qualquer efeito prático, pois não tem razão em relação a nenhuma delas. Vejamos:
1. Primeiro texto do segundo teste.
Vale a resposta que demos:
«Não merecer castigo em vez de não merecerem castigo.
Porque o sujeito da oração infinitiva é o mesmo de «consideravam discutível», isto é, «eles». Quando assim acontece, o infinitivo é impessoal.»
Quanto ao facto de termos admitido prevaricarem em circunstâncias idênticas umas linhas mais abaixo, o mesmo não é relevante pois quem está aqui a ser avaliado são os concorrentes e não nós.
2. Quanto à pergunta 24 do segundo teste, se tivéssemos reparado na contradição entre a gramática e o dicionário de referência, não a teríamos colocado. Mas o que é facto é que, por se tratar de uma questão de sintaxe, o que vale é a gramática de referência, a qual estabelece que não existe a primeira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo imergir. Não tem, pois, qualquer relevância que o dicionário de verbos do Grande Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora admita a forma "imirjo", pois este só prevalece "para avaliar a exactidão da grafia das palavras" (art.º 12, ponto 1 do Regulamento).
3. Em relação à pergunta 14 do terceiro teste, mais uma vez o que vale é o dicionário de referência, no qual está escarrapachado «Coloquial dar tanga a (alguém) divertir-se à custa de (alguém)». É certo que tanga aparece como sinónimo de mentira em todos os dicionários de calão credíveis; mas num concurso como este o dicionário de referência é como uma bíblia inquestionável, mesmo que esteja errado e, assim, engane os concorrentes (isto é, lhes dê tanga).
4. Quanto à pergunta 15 do terceiro teste, os concorrentes não teriam mais que adivinhar o que vai na cabeça dos elementos que compõem esta Comissão e não o contrário (isto é, termos nós de nos submeter àquilo que passa pelas vossas cabecinhas). Então não é óbvio que quando nos deparamos com a frase «Ele é distraído, se não parvo», o que se quer dizer é «Ele é distraído, mas também parvo»? Só ao caro concorrente, é que poderia ocorrer interpretar a frase como «Ele é distraído, se não for parvo»!
Nesta conformidade, o caro concorrente não acederá ao Olimpo dos finalistas, antes tendo de se conformar com o choro e ranger de dentes dos excluídos.
Mas não desista; tente para o ano!
Pela nossa parte tentaremos entretanto corrigir os erros de português do Regulamento e prometemos escolher uns textos menos desconchavados e sem erros de lógica.
A Comissão Técnico-Científica
Estão a ver como era fácil?
Com respeitosos cumprimentos.
Raul Afonso Queirós Pinheiro Henriques
Sinto-me como aquele sujeito que, tendo sido uns meses antes sodomizado por um gorila, respondendo à pergunta sobre se estava magoado, se queixava: "Claro que estou magoado; ele nem sequer se dignou mandar-me um postalzinho!"
De facto, essa douta Comissão não achou por bem responder aos argumentos que evoquei quanto a algumas respostas não coincidentes com as correcções aos testes do Campeonato, que enviei em sucessivas mensagens por correio electrónico e que dou aqui por reproduzidas.
Como não me conformo com essa ausência de respostas, tomo agora a liberdade de alvitrar, eu próprio, uma resposta possível às questões que coloquei, colocando-me na pele dessa douta Comissão.
Ex.mo concorrente
Pedimos desculpa pelo facto de só agora respondermos às questões que colocou, mas, como verá, tal não tem qualquer efeito prático, pois não tem razão em relação a nenhuma delas. Vejamos:
1. Primeiro texto do segundo teste.
Vale a resposta que demos:
«Não merecer castigo em vez de não merecerem castigo.
Porque o sujeito da oração infinitiva é o mesmo de «consideravam discutível», isto é, «eles». Quando assim acontece, o infinitivo é impessoal.»
Quanto ao facto de termos admitido prevaricarem em circunstâncias idênticas umas linhas mais abaixo, o mesmo não é relevante pois quem está aqui a ser avaliado são os concorrentes e não nós.
2. Quanto à pergunta 24 do segundo teste, se tivéssemos reparado na contradição entre a gramática e o dicionário de referência, não a teríamos colocado. Mas o que é facto é que, por se tratar de uma questão de sintaxe, o que vale é a gramática de referência, a qual estabelece que não existe a primeira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo imergir. Não tem, pois, qualquer relevância que o dicionário de verbos do Grande Dicionário da Língua Portuguesa da Porto Editora admita a forma "imirjo", pois este só prevalece "para avaliar a exactidão da grafia das palavras" (art.º 12, ponto 1 do Regulamento).
3. Em relação à pergunta 14 do terceiro teste, mais uma vez o que vale é o dicionário de referência, no qual está escarrapachado «Coloquial dar tanga a (alguém) divertir-se à custa de (alguém)». É certo que tanga aparece como sinónimo de mentira em todos os dicionários de calão credíveis; mas num concurso como este o dicionário de referência é como uma bíblia inquestionável, mesmo que esteja errado e, assim, engane os concorrentes (isto é, lhes dê tanga).
4. Quanto à pergunta 15 do terceiro teste, os concorrentes não teriam mais que adivinhar o que vai na cabeça dos elementos que compõem esta Comissão e não o contrário (isto é, termos nós de nos submeter àquilo que passa pelas vossas cabecinhas). Então não é óbvio que quando nos deparamos com a frase «Ele é distraído, se não parvo», o que se quer dizer é «Ele é distraído, mas também parvo»? Só ao caro concorrente, é que poderia ocorrer interpretar a frase como «Ele é distraído, se não for parvo»!
Nesta conformidade, o caro concorrente não acederá ao Olimpo dos finalistas, antes tendo de se conformar com o choro e ranger de dentes dos excluídos.
Mas não desista; tente para o ano!
Pela nossa parte tentaremos entretanto corrigir os erros de português do Regulamento e prometemos escolher uns textos menos desconchavados e sem erros de lógica.
A Comissão Técnico-Científica
Estão a ver como era fácil?
Com respeitosos cumprimentos.
Raul Afonso Queirós Pinheiro Henriques
2007/04/16
A voz
Hoje, não sei se sabem, celebra-se o Dia Mundial da Voz. Tenho imenso orgulho na minha voz. E respeito pelas vozes dos outros. A voz diz tudo sobre o seu dono. Embora tenha um fascínio especial pelas vozes mais que pelo aspecto dos outros, concordo que há por aí muitas vozes de burro. Curiosamente, muitas chegam mesmo ao céu. Um céu a evitar, portanto, a todo o transe, esse céu dos burros.
Aprecio sobretudo este fenómeno dos blogs que dão voz a pessoas como eu, que de outra forma teriam de calar a sua. Seja ela mais fininha ou mais potente, toda a gente tem a sua voz neste universo dos blogs. Embora reconheça que, em muitos casos, são mais as vozes que as nozes. O pior é que fora desse universo, estamos assim: há para aí muita gente que tenta abafar a nossa voz engrossando a sua. Mas a nossa --a minha e a vossa, leitores deste blog-- engrossa ela também e floresce com a possibilidade de se exprimir livremente. Muitos destes que falam grosso gostariam que a nossa voz não fosse tão audível, mas os seus desígnios sairão inevitavelmente frustrados.
A nossa voz é, antes de tudo o mais, a voz da resistência.
Há que ter cuidados com a voz, dizem os entendidos neste Dia Mundial da Voz.
Eu acho que o único cuidado possível é nunca calar a nossa, nem abafar a dos outros. Dentro das regras. O resto é conversa.
Aprecio sobretudo este fenómeno dos blogs que dão voz a pessoas como eu, que de outra forma teriam de calar a sua. Seja ela mais fininha ou mais potente, toda a gente tem a sua voz neste universo dos blogs. Embora reconheça que, em muitos casos, são mais as vozes que as nozes. O pior é que fora desse universo, estamos assim: há para aí muita gente que tenta abafar a nossa voz engrossando a sua. Mas a nossa --a minha e a vossa, leitores deste blog-- engrossa ela também e floresce com a possibilidade de se exprimir livremente. Muitos destes que falam grosso gostariam que a nossa voz não fosse tão audível, mas os seus desígnios sairão inevitavelmente frustrados.
A nossa voz é, antes de tudo o mais, a voz da resistência.
Há que ter cuidados com a voz, dizem os entendidos neste Dia Mundial da Voz.
Eu acho que o único cuidado possível é nunca calar a nossa, nem abafar a dos outros. Dentro das regras. O resto é conversa.
2007/04/15
A bombeira voluntária
Um dia aquela a quem eu chamo minha mãe não conseguia andar. Os anti-inflamatórios, tomados durante alguns dias, pareciam não estar a induzir melhoras e o médico assistente recomendou radiografias para se ver se havia alguma fractura.
Ambulância para lá, e horas de espera entre preenchimento de fichas, observação por médico de serviço ao banco do hospital, RX, constatação de que, felizmente, não havia qualquer fractura, chamamento da ambulância para o regresso, mais uma hora de espera.
Eis-nos dentro da ambulância, com um bombeiro a conduzir e uma simpática bombeira a acarinhar a minha mãe e a falar comigo. E se ela falava!
Quando tal se tornou evidente, percebeu-se também o sentido autocrítico dela:
-- Espero que isso não os incomode, mas adoro falar; e falo pelos cotovelos. Estou nos bombeiros, mas o que eu gosto é de estar com as pessoas. Ainda hoje de manhã, numa acção de formação sobre incêndios, me procurei esconder e passar despercebida. Tenho colegas que vêm para cá para combater os incêndios, mas eu fujo do fogo como o diabo da cruz. Alguns dos meus colegas acham que é um frete sair na ambulância, mas eu sou a primeira a oferecer-me. É por isso mesmo que eu estou aqui; porque nestas saídas estou com as pessoas, ajudo-as, falo com elas, aprendo, vivo. E quando não falo directamente ponho a conversa em dia no meu blogue. Também aí falo com as pessoas; falo eu e elas respondem, e volto a falar e os outros a falar comigo. Tenho sempre coisas para dizer.
Dizem que o nosso país não atingiu um patamar de riqueza suficiente para haver estímulo para o voluntariado. Cruzei-me outro dia com umas estatísticas que constatavam estarmos um abismo abaixo da média europeia também neste aspecto.
Aquela mulher de uniforme vermelho, oferecia alegremente o seu sábado para conversar com as pessoas que precisam de ajuda. É tão raro as pessoas darem sem pedir nada de material em troca, que isso me estimulou a prestar-lhe aqui esta modestíssima homenagem.
Bem aventurados sejam os voluntários!
Ambulância para lá, e horas de espera entre preenchimento de fichas, observação por médico de serviço ao banco do hospital, RX, constatação de que, felizmente, não havia qualquer fractura, chamamento da ambulância para o regresso, mais uma hora de espera.
Eis-nos dentro da ambulância, com um bombeiro a conduzir e uma simpática bombeira a acarinhar a minha mãe e a falar comigo. E se ela falava!
Quando tal se tornou evidente, percebeu-se também o sentido autocrítico dela:
-- Espero que isso não os incomode, mas adoro falar; e falo pelos cotovelos. Estou nos bombeiros, mas o que eu gosto é de estar com as pessoas. Ainda hoje de manhã, numa acção de formação sobre incêndios, me procurei esconder e passar despercebida. Tenho colegas que vêm para cá para combater os incêndios, mas eu fujo do fogo como o diabo da cruz. Alguns dos meus colegas acham que é um frete sair na ambulância, mas eu sou a primeira a oferecer-me. É por isso mesmo que eu estou aqui; porque nestas saídas estou com as pessoas, ajudo-as, falo com elas, aprendo, vivo. E quando não falo directamente ponho a conversa em dia no meu blogue. Também aí falo com as pessoas; falo eu e elas respondem, e volto a falar e os outros a falar comigo. Tenho sempre coisas para dizer.
Dizem que o nosso país não atingiu um patamar de riqueza suficiente para haver estímulo para o voluntariado. Cruzei-me outro dia com umas estatísticas que constatavam estarmos um abismo abaixo da média europeia também neste aspecto.
Aquela mulher de uniforme vermelho, oferecia alegremente o seu sábado para conversar com as pessoas que precisam de ajuda. É tão raro as pessoas darem sem pedir nada de material em troca, que isso me estimulou a prestar-lhe aqui esta modestíssima homenagem.
Bem aventurados sejam os voluntários!
2007/04/13
Engenharias (3)
NO MESTRE ESCAMA: SNR. ENGENHEIRO
- O senhor engenheiro, hoje não engraxa?
- Engraxo na Baixa.
Alexandre O'Neill
(in "Uma Lisboa Remanchada")
- O senhor engenheiro, hoje não engraxa?
- Engraxo na Baixa.
Alexandre O'Neill
(in "Uma Lisboa Remanchada")
Porquê a Ota?

Os poderes nacionais já ultrapassaram a fase de nos querer convencer de que é preciso um novo aeroporto em Portugal e de que ficaremos inevitavelmente afastados da "Europa" sem estas duas faraónicas obras. Quando falo em poderes englobo todos: Governo, oposições, comunicação social, parceiros socio-económicos.
Ambas estas obras são consideradas dados adquiridos e o que se discute são a localização e o traçado.
No entanto vale a pena lembrar que a Ota e o TGV são obras que inegavelmente vêm ao arrepio do afirmado esforço de contenção de despesas públicas (como se soube recentemente este esforço tem sido mais efectivo no campo das despesas de investimento do que nas de consumo corrente, as quais continuaram a crescer).
Então porquê todo este afã em levar para diante estes projectos?
A coisa prende-se com o modelo de desenvolvimento que queremos para o nosso país. Até agora o sector da construção civil é uma espécie de barómetro do que cá se passa: quando o sector está em crise, o país está em crise; quando está próspero o país está na maior e as pessoas optimistas. A gente habituou-se a viver assim...
No entanto é um sector que, do ponto de vista do produto que fabrica (casas, prédios, pontes, estradas) não é, em grande parte, reprodutivo: as casas servem para habitar e não são factores de produção. São-no indirectamente as vias de comunicação; directamente só as instalações fabris.
Como se sabe a construção civil vive actualmente uma época de crise, em que o parque habitacional já é excessivo para as necessidades, o que acarretou descidas significativas das margens, até agora tantas vezes especulativas.
O Governo teria agora a grande hipótese de separar águas: deixava o tão incensado mercado funcionar, não deitava a mão ao sector, as empresas não lucrativas morreriam por si; o que necessariamente implicaria a deslocação de pessoas e capitais para outros sectores. Safar-se-iam as empresas que se projectaram no mercado externo e fazem, com os seus técnicos e a sua tecnologia, obras noutros países, e as que se adaptassem ao mercado menos atractivo (dá mais trabalho, exige maior especialização e sensibilidade e não produz lucros tão elevados), mas agora tão urgente, do restauro das centenas de milhar de habitações degradadas (tantas delas património que urge não deixar morrer) e a precisar de intervenção.
Está-se mesmo a ver isto acontecer em Portugal!
O problema até nem reside tanto no grave abalo social que isto acarretaria: centenas de falências, milhares de desempregados a onerar ainda mais o parco pecúlio da Segurança Social.
E os autarcas e cliques respectivas? E os partidos políticos que compõem os orçamentos com os sacos azuis?
Vamos devagarinho nisso da escolha de um modelo de desenvolvimento mais exigente em termos de qualificação das pessoas e da tecnologia.
Por agora, venham as Otas, que ainda é tempo de otários.
Ambas estas obras são consideradas dados adquiridos e o que se discute são a localização e o traçado.
No entanto vale a pena lembrar que a Ota e o TGV são obras que inegavelmente vêm ao arrepio do afirmado esforço de contenção de despesas públicas (como se soube recentemente este esforço tem sido mais efectivo no campo das despesas de investimento do que nas de consumo corrente, as quais continuaram a crescer).
Então porquê todo este afã em levar para diante estes projectos?
A coisa prende-se com o modelo de desenvolvimento que queremos para o nosso país. Até agora o sector da construção civil é uma espécie de barómetro do que cá se passa: quando o sector está em crise, o país está em crise; quando está próspero o país está na maior e as pessoas optimistas. A gente habituou-se a viver assim...
No entanto é um sector que, do ponto de vista do produto que fabrica (casas, prédios, pontes, estradas) não é, em grande parte, reprodutivo: as casas servem para habitar e não são factores de produção. São-no indirectamente as vias de comunicação; directamente só as instalações fabris.
Como se sabe a construção civil vive actualmente uma época de crise, em que o parque habitacional já é excessivo para as necessidades, o que acarretou descidas significativas das margens, até agora tantas vezes especulativas.
O Governo teria agora a grande hipótese de separar águas: deixava o tão incensado mercado funcionar, não deitava a mão ao sector, as empresas não lucrativas morreriam por si; o que necessariamente implicaria a deslocação de pessoas e capitais para outros sectores. Safar-se-iam as empresas que se projectaram no mercado externo e fazem, com os seus técnicos e a sua tecnologia, obras noutros países, e as que se adaptassem ao mercado menos atractivo (dá mais trabalho, exige maior especialização e sensibilidade e não produz lucros tão elevados), mas agora tão urgente, do restauro das centenas de milhar de habitações degradadas (tantas delas património que urge não deixar morrer) e a precisar de intervenção.
Está-se mesmo a ver isto acontecer em Portugal!
O problema até nem reside tanto no grave abalo social que isto acarretaria: centenas de falências, milhares de desempregados a onerar ainda mais o parco pecúlio da Segurança Social.
E os autarcas e cliques respectivas? E os partidos políticos que compõem os orçamentos com os sacos azuis?
Vamos devagarinho nisso da escolha de um modelo de desenvolvimento mais exigente em termos de qualificação das pessoas e da tecnologia.
Por agora, venham as Otas, que ainda é tempo de otários.
2007/04/12
No rescaldo de Sócrates
Creio que foi o próprio Primeiro Ministro a referir (não sei se com ironia...), que a questão da sua sua licenciatura é um não-problema. Concordo com ele neste ponto. Este exercício a que nos obrigaram chegou a ser penoso. Pergunto eu: alguém está disposto a investigar ou a deixar-se investigar pela forma como obteve os seus diplomas? Algum desses jarrões que decoram a política portuguesa estará de facto disposto a expor perante os olhos de todos os Portugueses a forma como obteve os seus graus académicos? A confessar todas as passagens administrativas e os "canudos" vendidos no Rossio...?
Houvesse neste País a cultura do rigor, da honestidade e do primado do mérito e, de facto, nada disto teria sido notícia. Mas, alguém quer acabar de facto com o pântano? Não será a desonestidade o desporto nacional?
Só há um culpado nisto tudo: são os Portugueses, a sua generalizada estreiteza de vistas e a sua mesquinhez.
Se não fosse o culto da "cunha", se não fosse o culto doentio das aparências, dos "doutores", "engenheiros" e "arquitectos", deste gene de corrupção que parece fazer parte do DNA dos portugueses, nada disto seria notícia. Há muito que as instituições estariam acima de qualquer suspeita, há muito que o processo que conduz ao desempenho de cargos públicos seria enxuto e transparente, há muito que estaria instituido o culto do mérito, da solidariedade e da partilha.
Assim, como estamos, como tudo está preso por arames, à mínima brisa, ao mínimo problema estalam "crises" que, se não fosse o seu carácter profundamente trágico, só dariam para rir.
Desconfio profundamente das "crises" à Portuguesa. Pelo modo como vão as coisas, tudo indicia que por trás da denúncia de uma potencial falcatrua, estará certamente uma falcatrua em potência.
Neste momento, batemos no fundo. Chegados a um ponto em que a vida de todos nós acaba por ficar presa pela cadeira de "Inglês Técnico" do Primeiro Ministro, o melhor seria escolher, uma de duas: ou fazermos como as baleias e suicidarmo-nos colectivamente, ou procedermos a uma liquidação total e mudarmos de ramo...
Houvesse neste País a cultura do rigor, da honestidade e do primado do mérito e, de facto, nada disto teria sido notícia. Mas, alguém quer acabar de facto com o pântano? Não será a desonestidade o desporto nacional?
Só há um culpado nisto tudo: são os Portugueses, a sua generalizada estreiteza de vistas e a sua mesquinhez.
Se não fosse o culto da "cunha", se não fosse o culto doentio das aparências, dos "doutores", "engenheiros" e "arquitectos", deste gene de corrupção que parece fazer parte do DNA dos portugueses, nada disto seria notícia. Há muito que as instituições estariam acima de qualquer suspeita, há muito que o processo que conduz ao desempenho de cargos públicos seria enxuto e transparente, há muito que estaria instituido o culto do mérito, da solidariedade e da partilha.
Assim, como estamos, como tudo está preso por arames, à mínima brisa, ao mínimo problema estalam "crises" que, se não fosse o seu carácter profundamente trágico, só dariam para rir.
Desconfio profundamente das "crises" à Portuguesa. Pelo modo como vão as coisas, tudo indicia que por trás da denúncia de uma potencial falcatrua, estará certamente uma falcatrua em potência.
Neste momento, batemos no fundo. Chegados a um ponto em que a vida de todos nós acaba por ficar presa pela cadeira de "Inglês Técnico" do Primeiro Ministro, o melhor seria escolher, uma de duas: ou fazermos como as baleias e suicidarmo-nos colectivamente, ou procedermos a uma liquidação total e mudarmos de ramo...
2007/04/11
Ainda Sócrates
Valham-nos os blogs. Apetece-me deixar aqui uma ou duas notas sobre a questão do momento. Faço-o antes de ir para o ar a entrevista do primeiro-ministro, sem saber, naturalmente, como se vai ele sair dela.
Os jornais acusaram o primeiro-ministro de querer comandar a agenda política (whatever that means...) e de querer exercer pressão sobre alguns orgãos de comunicação, pressão que eles repudiaram. Olhando para a expectativa que rodeia esta sua presença na televisão, definida, situada e fixada por ele, nos termos que bem lhe apeteceu, temos de concluir que Sócrates já ganhou. Perante as acusações dos jornais, o primeiro ministro responde deixando a atenção do país (e dos jornais...) inteiramente presa a si. Os jornais saem batidos deste confronto. Hoje, mais do que nunca, é Sócrates que define a agenda dos jornais. Nem é preciso pressionar...
O único verdadeiro receio que toda esta questão poderia suscitar --o único verdadeiramente legítimo, o programa político do governo, a credibilidade deste e a do seu principal responsável para o cumprirem...-- vai ser, em resultado das motivações e da forma como todo este processo foi orientado, dissipado com maestria. Não tenho quaisquer dúvidas. Sócrates não vai à RTP para perder...
Convencidos que hoje vale tudo para vender papel e que se pode brincar impunemente com o fogo, os jornais prestaram-nos mais um mau serviço. Não há um único orgão de informação que saia daqui sem mácula. Mais um feito notável para assinalar na sua folha de serviço. Depois queixam-se da crise da imprensa.
Os problemas do país seguem dentro de momentos...
Os jornais acusaram o primeiro-ministro de querer comandar a agenda política (whatever that means...) e de querer exercer pressão sobre alguns orgãos de comunicação, pressão que eles repudiaram. Olhando para a expectativa que rodeia esta sua presença na televisão, definida, situada e fixada por ele, nos termos que bem lhe apeteceu, temos de concluir que Sócrates já ganhou. Perante as acusações dos jornais, o primeiro ministro responde deixando a atenção do país (e dos jornais...) inteiramente presa a si. Os jornais saem batidos deste confronto. Hoje, mais do que nunca, é Sócrates que define a agenda dos jornais. Nem é preciso pressionar...
O único verdadeiro receio que toda esta questão poderia suscitar --o único verdadeiramente legítimo, o programa político do governo, a credibilidade deste e a do seu principal responsável para o cumprirem...-- vai ser, em resultado das motivações e da forma como todo este processo foi orientado, dissipado com maestria. Não tenho quaisquer dúvidas. Sócrates não vai à RTP para perder...
Convencidos que hoje vale tudo para vender papel e que se pode brincar impunemente com o fogo, os jornais prestaram-nos mais um mau serviço. Não há um único orgão de informação que saia daqui sem mácula. Mais um feito notável para assinalar na sua folha de serviço. Depois queixam-se da crise da imprensa.
Os problemas do país seguem dentro de momentos...
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