2008/03/19

Hot Clube de Portugal

Nenhum músico, nenhum melómano, ninguém que esteja mergulhado, de uma forma ou de outra, no caldo da cultura poderá ignorar o jazz. E, nesta conformidade, ninguém poderá ignorar o Hot Clube de Portugal, o nosso local de culto, por excelência, deste estilo musical.
Ora, o Hot comemora hoje 60 anos de existência, imaginem só, e eu não queria deixar de assinalar a data aqui no Face.
Falar do Hot é, antes do mais, falar de Luís Villas-Boas, o seu fundador. Figura cimeira da divulgação da música de jazz em Portugal, foi também criador nos anos 60 do Luisiana, situado em Cascais --uma espécie de HCP II, entretanto desaparecido-- e já nos anos 70, do Festival de Jazz de Cascais, por onde passou uma parada inverosímil do who's who do jazz mundial.
O jazz é o sistema de improvisação estruturada mais elaborado que a música ocidental produziu, é uma arte de risco, uma arte sem rede. Não é a arte do registo, é a arte do instante em que é produzida. E o Hot tem tido um papel único em Portugal, ao longo destes anos, ao acolher todo os instantes de que é feita a arte da miríade de músicos, mais ou menos grandes, que por lá têm passado. Também por lá passaram alguns instantes fugazes da minha arte.
A par deste papel de divulgação o Hot abriu nos princípios dos anos 80 uma outra notável frente de acção ao criar a sua Escola. O impacte, certamente fulminante, da Escola do HCP na música portuguesa está por medir, mas estou certo que constituiria matéria de investigação musicológica do mais alto interesse. Alguém agarra o desafio?

2008/03/18

Iraque, ano cinco

Na semana em que passa mais um aniversário do início da guerra do Iraque, os "média" tentam contabilizar o número de mortos iraquianos. O número de mortos americanos é conhecido (cerca de 4.000) e, da sua contagem, encarregam-se diariamente diversos serviços nos Estados Unidos. O "New York Times" mantém, mesmo, uma rubrica onde publica regularmente a fotografia, o nome e o "ranking" do falecido. Quando o número de vítimas americanas atingiu os 2.000, o jornal publicou um encarte com as fotos de todos os soldados mortos. Sem comentários. Uma tomada de posição que calou fundo na opinião pública americana. Três anos mais tarde, não é de todo improvável que o NYT repita a edição, agora a dobrar...
Mais difícil de contabilizar parecem ser os mortos iraquianos. As estimativas variam entre 82.199 (segundo a organização britânica "Iraq Body Count") e os 1.033.000 mortos (segundo a "Opinion Research Business", uma organização de contagem britânica). Mas há mais estimativas: de acordo com o Inquérito de Saúde Familiar no Iraque (governo) elaborado em colaboração com a Organização Mundial de Saúde, teriam morrido cerca de 151.000 iraquianos. Já o estudo dos especialistas iraquianos, da Escola de Saúde Pública da Universidade Johns Hopkins, calcula terem sido 654.965 os mortos iraquianos, dos quais 601.027 em consequência directa da guerra.
Pesem as metodologias usadas (nem sempre coincidentes) o número 151.000 da OMS, parece ser o mais credível, dado que 92% das mortes foram confirmadas através das certidões de óbito.
Como sempre acontece, não faltaram as vozes "discordantes": Bush à cabeça (who else?) e o governo britânico, cúmplice da invasão, foram os mais críticos em relação aos números apresentados. Entre os tradicionais apoiantes portugueses, o descaramento não é menor: tanto Durão Barroso, como os "fazedores de opinião", José Manuel Fernandes ou Pacheco Pereira, continuam a defender a tese de que "perante os dados conhecidos" (que eram falsos) teriam apoiado a invasão...como se a invasão de um país soberano, à revelia das leis internacionais, fosse defensável. Que tudo tenha corrido mal, parece ser apenas um pormenor sem importância para estes defensores da "democracia ocidental". No fundo, o que são cento e cinquenta mil anónimos mortos?

2008/03/17

Perguntar não ofende...

Deixo uma pergunta singela... A moeda que serve de referência ao preço do petróleo continua a ser o dólar e este desvaloriza-se sistematicamente, como é sabido, face ao euro. Hoje lá foi ultrapassado mais um daqueles "limiares psicológicos" de que os orgão de informação tanto gostam de falar... Isto quer dizer que compramos mais petróleo com menos euros. Por que razão então os preços dos bens e serviços sofrem aumentos baseados no aumento do preço de um produto que na realidade diminuiu?

2008/03/14

Ribau-bau, pardais ao ninho...

Quando a descida do PS passou a ser um factor constante nas sondagens e do principal partido da oposição se esperava uma retoma, rebentou o "escândalo" entre os despeitados "barões" do PSD. Logo agora, que o seu secretário-geral prometia um acérrimo combate ao governo. Ele bem tenta, seja através do apelo à refiliação das "bases", seja alterando o logotipo e as cores da bandeira, mas a imagem não ajuda. A dele, claro.
Não fora as manifestações, que começam a fazer escola nas ruas de Lisboa, e diríamos que quase nada se passava de anormal nesta morronha.
Em contrapartida, o "homem da maratona", que devia ter todas as razões para estar preocupado, vê com alívio que dali não virá mal ao Mundo. Aparenta estar tão descontraído que até recebe entrevistadoras em casa...
Um país esquizofrénico este: enquanto centenas de milhares de pessoas protestam contra as insuportáveis condições em que são obrigados a (sobre)viver, os socialistas reunem para fazer um "balanço positivo" de três anos de governação. Não é de admirar. Com oposições destas, quem deseja no governo um partido de ribaus?

2008/03/08

Reforma Zero

O governo e a ministra da educação vão ter agora um enorme dificuldade em avançar com qualquer reforma do ensino. Os professores ganharam uma força que os ilibou automaticamente de quaisquer responsabilidades no que respeita à questão da qualificação dos portugueses, passada e futura. Tudo vai ficar na mesma.
De paixão em tragédia, assim se transformou a questão do ensino. Depois de todos estes meses, o que fica deste tema é que uns são "pró" outros são "contra"...
Perdemos (mais) uma oportunidade. Seria preciso muito bom senso e muita disciplina individual para ultrapassar a "reforma zero" que vai daqui resultar. Mas, como se previa deste confronto estúpido e inútil entre um governo de nabos e incompetentes e uma classe que não parece estar à altura das necessidades do país, bom senso é palavra que não existe e disciplina individual só se for imposta por uma qualquer carga de chuis solícitos... Não há, pois, nada a esperar.
Os juros políticos que todos iremos pagar por esta aventura vão ser certamente pesados, mas isso até é o menos. O País, esse, segue, como sempre, dentro de momentos.

2008/03/07

Novas Oportunidades

Agora que o nosso sistema de ensino tem vindo a ser tão contestado, é bom ver a polícia voltar às escolas.
Não sei se as visitas estão inseridas nalgum curso de "novas oportunidades", mas penso que devem ser dadas oportunidades novas aos polícias, com vista a obter mais conhecimentos e informações. Conhecimentos e Informações são, como sabemos, as bases de uma sociedade moderna, assente na Investigação e Desenvolvimento, paradigmas de qualquer governo que se preze. As escolas já tinham professores e alunos, faltavam só os polícias. Percebe-se a estratégia: uma vez nas escolas, os polícias não só as guardam, como ainda por cima, aprendem. Ainda dizem mal desta ministra de educação!

2008/03/05

A Guerra das Estrelas

Ainda não foi desta que os Estados Unidos - e o Mundo, por extensão - ficaram a saber quem será o candidato democrata nas próximas eleições americanas. Já no campo republicano, McCain limitou-se a cumprir calendário e a aumentar a sua confortável vantagem, sendo hoje o candidato oficial dos conservadores.
Numa noite de "tudo ou nada" para Hillary, a candidata ganhou dois estados determinantes (Texas e Ohio) e ainda arrecadou uma vitória em Rhode Island. Para Obama, restou Vermont, o estado "mais progressista" do mapa eleitoral americano.
Independentemente do resultado final, lá mais para o Verão, os sinais transmitidos nesta corrida de resistência democrata, confirmaram as tendências conhecidas: mais mulheres, latinos e trabalhadores de "colarinho azul" a votarem em Hillary; mais jovens, negros e classe média/alta, a votarem em Obama. Já em número de nomeações, a vantagem continua a pertencer ao candidato negro, que esta madrugada detinha 1477 lugares contra 1391 da rival. Tudo em aberto, pois.
Resta a questão principal: numa campanha marcada por "jobs, war and taxes" (empregos, guerra e impostos) qual será o candidato melhor apetrechado para debelar a crise americana? A ambiciosa, inteligente, realista e "experiente" Clinton, ou o ambicioso, inteligente, idealista e "inexperiente" Obama?
A avaliar pelos ataques pessoais dos últimos dias, a campanha só pode subir de tom. Não é, de resto, de excluír novas acusações, com vista a destabilizar o adversário. Até ao momento, o "clã" Clinton mostrou ter mais experiência nas "peixeiradas". Não é de todo improvável que resultem. Em Abril, saberemos.

2008/03/04

Hengameh

E, de repente, acontece poesia. Je vois la vie en rose, deve estar a cantar Hengameh, a mulher cujo marido foi condenado a dar-lhe 124 mil rosas! A setença foi ditada por um tribunal iraniano a Shahin, um homem avarento que não cumpriu a sua palavra relativamente ao dote prometido à mulher.
Shahin terá agora de desembolsar o equivalente a 163 mil euros em rosas se não quiser ir parar à cadeia.
A poesia já esteve na rua em 74, como observou Vieira da Silva. Agora foi visitar a Justiça. No Irão.

2008/02/29

Outra Ana

Outra Ana, desta vez de Benavente, resolveu partir a louça. Disse ela que se fosse professora estava na primeira fila das manifestações contra a Ministra da Educação, contra o seu próprio partido. O governo reagiu.
Anda qualquer coisa de verdadeiramente obsceno no ar.
Ao olhar para os cacos que se vão espalhando um pouco por todo o lado, ao observar as acções e o comportamento do governo e das oposições (ontem na AR, por exemplo, foi um autêntico festival!), ao verificar o que vai fazendo mover a política e os políticos, ao ouvir as reacções dos poderosos quando são colocados na iminência de ter de prestar contas, ao sentir a auto-complacência da imprensa, mas, sobretudo, quando vamos nós fechar as contas no término de mais um dia, ficamos com uma fortíssima sensação de enfartamento.
Um sensação que não é afinal tão difusa como pretende o relatório da SEDES.
Num primeira tempo, constatamos que com simples Rennies a coisa, como é óbvio, já lá não vai. Vem então a convicção que teremos de passar rapidamente a uma terapêutica mais agressiva...

2008/02/24

Ana e o cilindro

Há entrevistas assim. A de Ana Gomes à RR, que ontem passou na RTP2 e hoje pode ser lida no "Público", é uma delas. Das entrevistas e das entrevistadas. Marcantes. Resta saber o que acontecerá agora.
Diz Ana, entre outras coisas, que há muito mais dados sobre os voos de prisioneiros da CIA (para Guantanamo) para serem tornados públicos e que este é um processo imparável, como as desculpas do governo inglês de Gordon Brown já o provaram. Não compreende, por isso, que o governo português actual (defensor dos direitos humanos, como ela gosta de frisar) não queira e até impeça um inquérito aberto e profundo sobre tão delicada matéria. Porque é disso que se trata. Uma matéria delicada para Portugal, cujas relações com os EUA o governo do PS não se atreve a pôr em causa.
Mas Ana diz mais: que o acordo da utilização da base das Lajes nos Açores, apesar de existir desde os anos cinquenta, nunca foi ratificado pelos americanos. Os sucessivos governos portugueses (de Salazar a Sócrates) sempre assinaram, mas os EUA não assinam. Limitam-se a utilizar a base (que é nossa). Extraordinário.
Sobre as suas opiniões, e como são vistas dentro do partido a que pertence, não podia ter sido mais esclarecedora: "Começaram por tentar comprar-me dizendo: 'Vê lá se não queres ir para a próxima lista (do PE)'. Depois, era a intimidação, as acusações de deslealdade. Agora estamos noutra, a que quase chamaria de cilindragem. A menos que me passem com um carro por cima, eu não paro". Uma mulher de coragem, a Ana.
Só que, depois, "borra a pintura toda", ao dizer: "Tenho dito que o primeiro-ministro tem sido mal informado e mal aconselhado nesta matéria". Oh Ana, mal aconselhado nesta matéria? O Sócrates? O condutor do cilindro?
E eu que estava a gostar tanto da entrevista...

2008/02/23

Encontros ALCULTUR

Durante quatro dias, o Centro Vila Flor em Guimarães foi palco de mais uma edição dos "Encontros Alcultur". Uma iniciativa coordenada por Victor Martelo (Cultideias) que, ao longo dos últimos anos, tem vindo a afirmar-se no seio do movimento artístico-cultural português. Depois de três edições bienais, realizadas respectivamente em Faro, Portalegre e Almada, os "Encontros" parecem ter agora atingido a "maior idade", passando a anuais a partir do próximo ano.
A edição que hoje terminou, subordinada ao tema "Cultura, Emprego, Economia", foi a mais participada de sempre tendo registado cerca de 350 participantes inscritos, entre agentes culturais, decisores, criadores e patrocinadores, para além do público anónimo que assistiu às diversas sessões do evento.
Dos "Encontros" deste ano constavam duas sessões plenárias, cinco sessões temáticas, duas conferências e duas reuniões paralelas, para além de uma feira (Expocultura) e diversos "showcases" de música, teatro, dança e "performances" ao ar livre, nos intervalos entre sessões.
Das sessões temáticas, "Estímulo e constrangimentos à circulação artística", "Construir cidade: arquitectura, cultura e desenvolvimento", "A formação e qualificação dos profissionais das artes e da cultura", "Empreendedorismo e inovação em cultura: as indústrias criativas e as empresas culturais" e "Emprego, condições de trabalho e estatuto profissional dos profissionais das artes e da cultura", destaque para as intervenções de António Câmara
(director da YDream/Universidade Nova) e Ângel Mestres (Transit Projects/Barcelona) que de uma forma criativa e pragmática nos deixaram antever o futuro das industrias criativas e a sua interligação com a economia. Muito há ainda a fazer neste campo (em Portugal quase tudo), mas as pistas deixadas e o entusiasmo suscitado nas centenas de participantes, parece reforçar a ideia de que existe potencial humano, assim os decisores saibam aproveitar a dinâmica existente neste sector.
No campo da circulação de produtos, realce para a sessão plenária de directores de teatros, que resultaria na mais longa e animada discussão à volta do tema das "redes" e a sua operacionalidade, com boas intervenções e.o. de Rui Horta (Montemor) e José Bastos (Vila-Flor) que melhor enquadraram o problema das estruturas existentes e a dificuldade da sua utilização. Tema para ser debatido muito em breve com o novo ministro da Cultura e o que mais se seguirá...
Boas perspectivas, pois, para os próximos "Encontros", já agendados para 2009 em Lagos. Lá estaremos.

2008/02/22

O costume

A SEDES elaborou um relatório que tem sido muito badalado hoje nos meios de comunicação. A questão substantiva que o relatório aborda já é velha: a situação que se vive hoje no país é preocupante e há perigos à espreita para a democracia. O Diário Económico diz hoje que a situação da economia europeia tende a sofrer as consequências das dificuldades pelas quais os norte-americanos estão a passar, que à Europa está reservado um mau bocado e que as projecções económicas do governo português para este ano, face a esta conjuntura são fantasiosas.
A propósito destas questões, os responsáveis têm repetidamente observado que não nos podemos resignar e que a solução da crise está nas nossas mãos. O Presidente da República não encontrou mais nada para dizer hoje a este propósito: não podemos aceitar a resignação.
Mas, não foi sempre assim? Haverá outra alternativa? Haverá outro caminho para os portugueses superarem as suas dificuldades? Ou o Presidente da República estava convencido que eu pensava que era ele que ia passar a pagar-me as contas?

2008/02/20

A outra face...

Devo antes de mais prevenir que não me revejo nos princípios da Igreja Católica e que tenho uma antipatia especial e marcada pelos seus "ministros". Feitas estas advertências ao leitor conto-lhe o que me levou a escrever este post.
Acabo de saber que os reclusos que sequestraram um padre na Cadeia de Pinheiro da Cruz em 2006 foram condenados a uma pena única de seis e dez meses de prisão. Não está aqui minimamente em causa uma apreciação do acto que levou a esta condenação, nem sequer da justiça da setença proferida. O que neste caso me choca são as declarações do padre Júlio Lemos, a vítima de todo este imbróglio. Não tenho quaisquer indícios adicionais sobre este caso, nem sobre as circunstâncias em que terá ocorrido e nada sei sobre as qualidades humanas, quer dos condenados, quer do padre Lemos, embora tenha consciência que há gente melhor e pior em todas as áreas da actividade humana e que as aparências por vezes enganam, de facto. Mas, sei o que ouvi. Apenas conheço a verdade institucional que me é transmitida pelos orgãos de informação.
E o que ouvi eu o padre Lemos dizer? Disse ele que não estava muito "preocupado com a sentença", que o mais "importante foi ter tudo acabado bem" e que "a vida é o mais importante."
Nem uma palavra de perdão...
A sentença não o preocupa. Naturalmente. E está contente por "ter tudo acabado bem"... Mas, acabou bem para quem, acabou bem como?
Uma oportunidade perdida para o padre católico Júlio Lemos mostrar que a doutrina que professa não passa de retórica oca. Se não houver alguém a dar o exemplo de incondicional perdão, se não houver alguém a mostrar à sociedade que há outras formas de nos relacionarmos uns com os outros sem ser pela pena de Talião, se não houver alguém a mostrar que há outros valores, se não houver alguém a mostrar nobreza de carácter e superioridade face às vicissitudes da vida, como poderá o ser humano alguma vez evoluir? E não é isto, antes de mais, a missão da Igreja?
Ora explique-nos lá padre Júlio Lemos: perante o seu Deus, que vida é a mais importante? A sua, ou as dos reclusos de Pinheiro da Cruz agora condenados?

2008/02/17

Caixa de Pandora

A decisão unilateral dos dirigentes kosovares em proclamar a independência de uma região que é parte integrante dum país soberano (a Sérvia), foi certamente gratificante para os seus habitantes, mas não resolve o problema de fundo de um estado artificial. Trata-se de uma antiga questão, esquecida com a desintegração do império austro-húngaro e posteriormente abafada na ex-Yugoslávia, uma federação de repúblicas até meados dos anos noventa. Com a morte de Tito e a posterior queda do muro, em finais dos anos oitenta, teve início a desintegração da Yugoslávia que parece não ter ainda terminado. Depois das independências da Eslovénia, Croácia e Macedónia em 1991, da Bósnia e Herzegovina em 1995 e do Montenegro em 2006, sobrou a Sérvia, o último reduto Yugoslavo e, agora, também um país independente.
Acontece que o Kosovo não era uma república, mas uma região (do tamanho do Minho) com uma população maioritariamente muçulmana e albanesa. Paradoxalmente, é no Kosovo que a Sérvia tem as suas raizes, razão pela qual os sérvios não abdicam desta região. Após os bombardeamentos de Belgrado, que levariam à rendição do regime de Milosevic, (acusado de genocídio do povo kosovar) o Conselho de Segurança da ONU, através da resolução 1244, concedeu ao Kosovo uma maior autonomia sem reconhecer a sua independência.
É ao arrepio desta resolução e com o apoio dos EUA e alguns países europeus, entre os quais a Albânia (que tem ambições regionais de expansão) que o Kosovo proclamou hoje a independência. Contra esta decisão está a Russia (com problemas internos semelhantes) e alguns membros da União Europeia. Se a moda pega, porque não o País Basco, a Catalunha, a Córsega ou as regiões minoritárias sérvias, dentro da Bósnia? Uma verdadeira caixa de pandora pode ter-se aberto nos Balcãs, onde o passado nunca foi pacífico. Há quem acredite que a História não se repete, mas a dúvida é pertinente.

2008/02/16

Esquecer as pessoas, Export-Import SA

Volta não volta lá lemos mais uma notícia de uma criatura qualquer que nos Estados Unidos pega numa arma e atira sobre a multidão. Acontece em edifícios públicos, em parques e o atirador acaba geralmente a sua "performance" suicidando-se.
Não é só no E.U.A. que acontece este tipo de massacrees, claro, mas este país é particularmente fértil neste tipo de casos. Desta feita foi na universidade de Illinois Norte. Um antigo aluno da universidade atirou sobre mais de uma centena de alunos que assistiam a uma aula, matou cinco, feriu quinze e suicidou-se a seguir.
Pergunto o que leva uma pessoa a cometer este tipo de actos, e pergunto o que leva este tipo de actos a ocorrer com tanta frequência naquele país.
O acontecimento foi o quarto numa só semana nos E.U.A., que originaram um total de 9 mortos. O ano passado ocorreu um outro no Virginia Tech do qual resultaram 33 mortos.
Por coincidência, no mesmo jornal onde li este caso (o Público de hoje), a cineasta moçambicana Isabel Noronha declarava, a propósito dos recentes acontecimentos em Moçambique, que as reformas ditadas pelo Banco Mundial para esse país "esqueceram as pessoas".
É grande a tentação de dizer que nos E.U.A. os casos frequentes de massacres, do género do que ocorreu agora no Illinois, se fica a dever ao facto de ali se terem há muito esquecido das pessoas...

2008/02/15

Trimestral

De acordo com o INE, o desemprego médio em Portugal foi de 8% em 2007. Pior do que nós, na Europa a 27, só a Eslováquia (10,8%) e a Espanha (8,6%). Desde 2000, quando as estatísticas registaram uma taxa de 3,9%, que o desemprego em Portugal não pára de aumentar. São 448.000, os desempregados actualmente registados nos Centros de Emprego, 50% dos quais de longa duração (mais de um ano) e 125.000 com mais de 45 anos.
Confrontado com estes números, o primeiro-ministro "deu a volta ao texto" e disse que as comparações devem ser feitas com períodos homólogos. No quarto trimestre de 2007 havia 8,2% e no quarto trimestre de 2008, havia 7,8%. Logo, estamos no bom caminho...
Acontece que, entre Dezembro 2007 e Janeiro 2008, o número de desempregados aumentou em 12.000. Porque a taxa de crescimento económico não atinge sequer os 2%, (a economia diz-nos que é necessário um crescimento mínimo de 2,5% para criar emprego) não é previsível, a médio prazo, uma mudança substancial desta situação. Ou seja, enquanto o desemprego se mantém estruturalmente alto e não é crível a sua diminuição, Sócrates diz-nos que devemos segmentar a estatística, pois dessa forma teremos uma imagem mais optimista da realidade. Ora aqui está uma boa notícia para os desempregados: quando estiverem deprimidos, pensem no trimestre homólogo!

2008/02/13

"Turning Point?"

A tripla vitória de Barack Obama nas primárias de ontem, onde conquistou os estados da Columbia, Maryland e Vírginia, está longe de garantir-lhe a vitória final nas eleições do campo democrático, mas são um sinal inequívoco da "onda" que, neste momento, parece varrer os EUA. Com 8 vitórias consecutivas e 1.223 delegados conquistados (em 2.025 possíveis), Obama ultrapassou pela primeira vez a sua rival directa e tornou-se o fenómeno maior destas eleições norte-americanas. Para Hillary Clinton, que à partida parecia ter os melhores argumentos, os tempos não parecem fáceis. A candidata natural dos democratas tem agora 1.198 delegados, o que não sendo uma diferença significativa em relação ao seu oponente, poderá ser um factor psicológico determinante no comportamento dos votantes futuros. Provavelmente, estamos a assistir a um "ponto de não-retorno" nestas primárias e, a avaliar pelas mudanças operadas no "staff" de Hillary, a candidata percebeu bem os sinais.
Por outro lado, no campo dos Republicanos, as contas começam a tornar-se fáceis. Com um total de 821 delegados (em 1.191 possíveis), a candidatura de John Mccain está a um passo de tornar-se oficial. Os 241 delegados de Mike Huckabee não devem constituir grande ameaça para o veterano do Vietnam. À falta de melhor, esta deve ser a dupla que o campo conservador vai eleger.
Pese a distância e a impossibilidade real de votarmos nas eleições norte-americanas, não podemos ficar-lhes indiferentes. Para o bem e para o mal, os seus resultados vão sentir-se do lado de cá do Atlântico. Como sempre, aliás. Daí o interesse em segui-las. Porque também somos parte interessada.

2008/02/12

Timor

O que se passou em Timor continua sem explicação clara. Para além da névoa, subsiste, para mim, uma outra dúvida: o que pensam agora os portugueses de tudo isto?
Lembram-se, certamente, todos do que foi o movimento gerado em Portugal depois dos massacres em Díli e do que foi a reacção dos portugueses face às imagens que nos foram chegando através da televisão. Lembram-se, certamente, todos do movimento maciço que se gerou (parecia espontâneo!) na altura da discussão do assunto no Conselho de Segurança. Lembram-se, certamente, todos das fitas brancas nas antenas dos carros (ainda hoje há carros que as conservam).
Os portugueses pareciam ter encontrado à volta da causa timorense o pretexto para uma inesperada, alargada e quase impensável união. A causa timorense uniu os portugueses entre si e uni-os, de forma que pareceu desinteressada, a um povo sobre o qual, na prática, conheciam afinal muito pouco.
O que pensar de tudo isto agora? O que pensar daquele povo que parece não conseguir governar-se sozinho e que só encontra, aparentemente, um método para resolver os seus problemas? Onde está a "inocência" de Timor? Onde estarão os inocentes? Haverá inocentes em todo este processo?
Que "união" resta hoje à volta desta causa? Que imagem terão os portugueses dos timorenses neste momento? Que imagem subsiste das vítimas "inocentes" do "carrasco" indonésio, agora entregues a si próprios?

2008/02/08

Alegre Socialismo

Manuel Alegre não se revê no partido socialista actual. A razão terá a ver com a natureza do Partido, que tem muito pouco a ver com o PS que ajudou a fundar. Faz sentido. Alegre, para o bem e para o mal, "nunca se cala" e essa atitude - nos tempos que correm - é de louvar. Muito boa gente, quis ver neste "acto" o prelúdio de uma cisão a prazo. Essa é, de resto, a pergunta que os jornalistas, logicamente, fazem. Mas, Alegre, uma vez mais, diz que não. Não concorda com o Partido de Sócrates, mas acredita no Partido Socialista. Também não quer criar um novo partido (senão já o teria feito após as eleições presidenciais de 2006). Provavelmente, acredita que, para além da sua, há mais vozes discordantes dentro do actual PS. Este é, de resto, um argumento avançado depois da recente remodelação do governo (vista como uma concessão à facção contestatária). Esta semana, Alegre teve uma boa oportunidade para mostrar a coerência do seu pensamento. Bastava ter votado ao lado do Tó Zé, o único que "ousou" furar a disciplina partidária na votação sobre o Tratado de Lisboa. Que fez Alegre? Absteve-se. Assim, é difícil acreditar no Socialismo de Alegre.

2008/02/04

Produtividade

Para quem duvidava do zelo dos funcionário públicos portugueses, é sempre bom lembrar que há excepções. Uma delas foi o ex-ministro Telmo Correia que, numa noite de insónias, chegou a despachar 300 processos pendentes no seu Ministério. Por acaso, no último dia do seu mandato e em funções transitórias. Certamente devido ao cansaço, entregou o edifício do Casino de Lisboa ao Estoril-Sol. Já anteriormente, o ex-ministro Paulo Portas, por acaso do mesmo partido, tinha mandado fotocopiar milhares de documentos no Ministério da Defesa, com o argumento de que se tratava de notas pessoais. Isto tudo num par de horas.
São exemplos destes que devem orgulhar-nos e servir de argumento contra aqueles que sempre criticaram a nossa baixa produtividade. Sim, em média produzimos pouco e mal, mas quando "produzimos" é a sério!

2008/02/02

"Fait-Divers"?

As recentes revelações do jornal "Público", sobre as alegadas incompatibilidades do deputado Sócrates em 1989, levantam algumas questões fundamentais que convém, desde já, clarificar: estamos perante um ataque do referido matutino ao actual primeiro-ministro, onde vale tudo, desde que o "alvo" a abater seja o "inimigo principal" do engenheiro Belmiro? Estamos perante um mentiroso compulsivo, que não olhou a meios para atingir os seus fins, numa época em que o escrutínio dos políticos era bem mais benévolo? Ou estamos perante uma investigação séria, que deve ser tomada como tal? E, se assim é, porquê Sócrates e não outros?
Mais do que as especulações que possam circular nos "mentideros" políticos e jornalísticos, seria bom que ambas as partes apresentem as "provas" de que dispõem para que estas possam ser avaliadas. Em última análise, alguém deve ter razão e só ganharíamos todos em perceber o que se passou, se é que alguma coisa teve lugar. De outra forma, criou-se mais um "fait-divers" em que o circo lusitano é demasiado fértil. Nada de novo, nesse campo, mas é bom que olhemos para a Lua, em vez de fixarmos a atenção no dedo que para esta aponta...

2008/01/29

Tapar buracos?!

Marcelo Rebelo de Sousa, esse verdadeiro oráculo de televisão, disse hoje na RTP 1 que o primeiro ministro tinha optado por uma operação de tipo tapa-buracos ao remodelar o executivo. E, dentro deste critério de tapar buracos, justificou a sua afirmação dizendo que a nova ministra da saúde entrava porque era difícil ser-se pior que Correia de Campos e porque era... uma senhora! Vamos ver se o primeiro ministro emite um comunicado a explicar isto tudo bem explicadinho aos portugueses.
O professor Marcelo já está como a sombra do Lucky Luke! Consegue disparar mais rápido que o pensamento...

Das Märchen de Emmanuel Nunes, 2ª parte

A novela, pelos vistos continua. Agora juntam-se novos personagens. Depois de ter lido declarações inconcebíveis de um colega compositor a propósito desta obra, antes mesmo da estreia, vejo agora novas vozes de outra gente chegada à área da cultura que se juntam ao coro. Vozes que, na minha opinião fariam melhor em guardar um silêncio, digamos, civilizado sobre esta matéria. O argumento agora é que a dose foi violenta e o prato servido terá sido iguaria demasiadamente requintada para os estômagos curtidos dos portugueses. Eufemismo para o vulgar "para quem é bacalhau basta..."
O assunto ainda sobe à Assembleia, vocês vão ver! Estou a ver a ministra a ser chamada à AR, as conferências de imprensa dos grupos parlamentares, a agitação a crescer, a conferência de líderes, quem sabe uma moção de censura, a crise parlamentar, o desconforto das chefias militares, uma nota da Presidência da República lida com ar solene às 20h do Palácio de Belém, e, finalmente, a convocação de eleições antecipadas. Os historiadores do futuro chamar-lhe-ão "A Märchenada"!
Olhem que não sou eu que estou a exagerar...

Air-Guantanamo

A notícia, divulgada por uma ONG britânica, sobre a passagem de 700 prisioneiros por território português, a caminho de Guantanamo, não deve surpreender-nos. As conclusões da Comissão Parlamentar Europeia, apresentadas pelo deputado Carlos Coelho em 2007, eram já indiciadoras da responsabilidade portuguesa nesta sensível matéria. Perante o silêncio cúmplice do govêrno, também Ana Gomes solicitou um inquérito ao PGR, que ainda está em curso. Independentemente do número exacto de prisioneiros e das conclusões do Procurador-Geral, é cada vez mais evidente a mentira que os sucessivos governos - de Durão a Sócrates - mantiveram sobre este assunto. Trata-se de saber se os EUA fizeram os "transportes" sem o conhecimento do governo português ou se o nosso governo sabia e calava. A justificação, dada por Luís Amado, de que não podíamos controlar o que se passava nas Lajes, não é sustentável. Então, "nós" não sabíamos e os ingleses sabiam? Uma mentira, pois. É relativamente à mentira que devemos indignar-nos e exigir que sejam dadas explicações.

2008/01/28

Das Märchen de Emmanuel Nunes

Parece que metade do público terá abandonado a sala a meio da estreia da ópera "Das Märchen" de Emmanuel Nunes. Pelo menos assistiram a meia ópera uma vez na vida! E, se calhar, um dia ainda vão meter isso no currículo...