2010/08/11

Manobras do "aparelho"

Narciso Miranda, o "vice-rei do Norte", foi expulso do Partido Socialista. Ele e mais 200 militantes de base, que apoiaram a sua lista nas últimas eleições autárquicas de Matosinhos.
Aparentemente, a razão invocada pelo PS, ao qual Narciso Miranda já pertence desde 1974, assenta numa interpretação dos estatutos que impede um militante de concorrer contra listas do seu próprio partido.
Ora, de acordo com a versão de ex-presidente de Matosinhos, a federação do Norte, onde ele e os militantes expulsos estavam enquadrados, não os deixou apresentar listas para escolherem os candidatos locais. Daí, a necessidade de uma lista alternativa nas eleições autárquicas de 2009.
Vem de longe a animosidade, de um certo PS, ao ex-presidente de Matosinhos. Entre outras razões, pelo seu envolvimento no célebre caso da Lota, que terminaria com a morte prematura de Sousa Franco. Acontece que, para além de Miranda, mais gente esteve envolvida nesse deplorável momento da democracia portuguesa, entre os quais o seu principal oponente em Matosinhos, hoje assessor de António Costa na Câmara de Lisboa...
Miranda (com ou sem razão) é um homem ferido na sua honra e não hesita em acusar a geração actual de dirigentes sem profissão que vegetam no partido, sem ideais, para além do poder pelo poder.
Como bem analisou Adelino Maltês, já vimos este filme noutras épocas e noutros partidos, ao longo da história portuguesa recente. Estamos a assistir ao fim de um ciclo que não vai acabar amanhã, mas vai levar alguns, talvez dezenas, de anos...
Que Narciso, um homem do "aparelho" há 37 anos, não tenha ainda compreendido isto e apelide os camaradas de "estalinistas", é difícil de acreditar. E se o homem for mesmo socialista?

2010/08/09

"O ensino do Português"


Entrevista no Jornal das Nove de Mário Crespo a Maria do Carmo Vieira, professora, a propósito de um livro de sua autoria, agora publicado chamado "O ensino do Português". Vou ver se consigo apanhar o link e partilhá-lo aqui convosco. Entretanto, há uma outra intervenção dela numa edição do Plano Inclinado e pode ver aqui uma outra entrevista.
Esta dada a M. Crespo é uma entrevista sem tiques da moda, com silêncios significativos, de verdadeira reflexão, uma mulher certamente apaixonada e totalmente comprometida com aquilo que faz. Não saber escrever correctamente o Português implica não pensar bemos alunos foram passando nestes anos sem saberem nadapor causa do facilitismo estamos a criar alunos que se vão tornar vítimas da sua própria ignorância, eis algumas ideias fortes, provocações lançadas à nossa consciência por esta mulher de aparência frágil, exuberante discreta, desinibida, sem complexos e sem papas na língua. Vale a pena ver esta entrevista. Um momento raro de televisão.

Ladyzhensky

Não deixa de ter o seu quê de ironia... Enquanto a Rússia sofre uma onda de calor extremo que leva a que a média diária de mortes tenha duplicado durante este período, um russo foi procurar na Finlândia o calor que, certamente, ainda lhe faltava em casa e morreu, sábado passado, vítima de queimaduras graves... numa competição de sauna.
A dita, soi-disant, "competição" chama-se "Campeonato Mundial de Sauna" e consiste em permanecer, o máximo de tempo possível, numa sauna aquecida a 110 º C.
O mais estranho é que a "competição" atraiu cerca de 1,000 espectadores e ao lado de Vladimir Ladyzhensky --o nome do "herói" agora desaparecido-- estavam outros 130 "atletas", especialistas neste desporto de cozer ao vapor.




2010/08/05

Mas vamos ter submarinos, caraças!

Um "contexto de contenção orçamental e de redução da despesa pública" foi a justificação arranjada pelo Ministério da Educação para congelar as verbas atribuídas ao ensino da música, no âmbito do chamado ensino artístico.
Trata-se de uma manobra feia, feita, como alguém me apontou, assim, pela calada do verão, que apanha toda a gente de surpresa e em contraciclo daquilo que tinha sido a orientação do ME. Nesta onda de disparar em todas as direcções e atacar os mais vulneráveis, os ataques também chegam à pobre da música que fica assim mais pobre ainda...
A medida é tomada numa altura que não permite às escolas honrar compromissos assumidos em tempo oportuno, prejudicando essas escolas, os seus professores e alunos. E suspeito que, no caso dos professores, os mais prejudicados serão justamente os jovens licenciados que buscam uma oportunidade de se "inserir no mercado de trabalho", justamente aqueles por quem os responsáveis vertem lágrimas cínicas a toda a hora e que dizem querer proteger. E vamos ver como se resolve o problema dos alunos já matriculados, que agora ficam de fora por falta de verba...
É significativo que esta medida seja tomada pelo Ministério da Educação numa altura em que uma, digamos, escritora detém a pasta, e em que temos como Ministra da Cultura, digamos, uma pianista. Diz bem do peso que elas, a educação e a cultura terão no Conselho de Ministros e diz bem do peso que para estas ministras tem o ensino artístico. Cultura e ensino, são, como fica amplamente demonstrado para quem ainda tinha dúvidas, conceitos descartáveis.
Não pode esta medida deixar de suscitar a todos nós o mais vivo repúdio!

Chapéus e cartéis

O presidente do México Felipe Calderón declarou ontem numa conferência sobre crime no México que os gangues da droga se afastaram do seu modo de operação habitual, que consiste na produção e distribuição da droga, para se transformarem num governo de facto nas áreas que controlam. Felipe Calderón diz que só ao governo cabe a cobrança de impostos, mas estes gangues ao extorquirem dinheiro tanto a comerciantes com actividade legítima, como ilegítima --uma espécie de impostos-- estão a desafiar o governo, e até a tentar substituí-lo. Os cartéis da droga, refere Calderón, pretendem criar um monopólio e mesmo as suas próprias leis pela força das armas. Deixá-los entregues às suas actividades, sem reacção, afirma o presidente do México, "é simplesmente inaceitável."
É o que pode acontecer aos estados quando o voto que legitima os seus dirigentes se demite de controlar os abusos.
A linha que divide os cartéis da droga de um governo legítimo pode ser de facto ténue. Há uma diferença real entre a cobrança legítima e a extorsão de impostos, mas ela nem sempre é clara... De resto, cobrar impostos, criar monopólios e leis, pela força das armas se for necessário, não é exclusivo dos cartéis da droga. Há outros métodos para nos extorquir os impostos e cercear  a nossa liberdade, e há outros cartéis que não precisam sequer de armas. Basta-lhes palavreado embalador.
A linha que divide o exercício legítimo e ilegítimo do poder é ténue, por vezes mesmo invisível, e vai-se curvando às circunstâncias.
Cartéis, tal como os chapéus, há muitos...

2010/08/03

Estupidez

O Almirante Vieira Matias usou palavras fortes para caracterizar, o que ele considera, uma campanha contra a aquisição dos submarinos. Usou, a propósito, o termo "estupidez" várias vezes e de forma particularmente veemente. Deixa-me sempre inquieto ouvir um alto dirigente militar usar este tipo de "argumentos" para defender o seu ponto de vista.
Acontece que o custo dos submarinos é da ordem dos 980 milhões de euros, o que constitui uma percentagem à volta de 0.6% do PIB. São valores que impressionam. Não quero fazer aqui comparações rigorosas (não é fácil...) mas deixem-me dar dois exemplo. Em 2006, o custo total do sistema de saúde,  por exemplo, terá sido de cerca de 10% do PIB. Em 2007, o custo total das pensões mínimas do regime geral de segurança social foi de cerca de 3 milhões de euros, aproximadamente 0.3% do que custaram agora estes subamarinos. Ou seja, em traços muito gerais e mesmo que corrigíssemos o desfasamento temporal destes dados e a sua previsível variação para os anos subsequentes (que eu não fiz!) é fácil perceber que o Estado consome, levianamente, em dois submarinos, uma percentagem incompreensivelmente grande do nosso PIB. Dois submarinos apenas custam mais de 300 vezes o valor que a totalidade dos pensionistas mais pobres recebeu em 2007. São opções que custa aceitar e só por leviandade se pode dizer que quem se opõe a estas escolhas é estúpido.
E por isso acho que uma aquisição destas representa uma injustiça sem justificação e por isso não devia ser feita. Eu diria, se fosse almirante, que é uma estupidez... A situação das finanças públicas agrava ainda mais, claro, todo este quadro, mas nem era necessário tê-la em conta.
Corremos o risco de ver umas dezenas de marujos a divertirem-se à grande com estes brinquedos novos que lhes arranjaram, enquanto os tais "novos pobres" e os velhos pobres vão caindo aí pelos cantos sem nada para comer, batendo à porta do bispo Carlos Azevedo para este lhes arranjar uma bucha.
Ou querem ver que é tudo mentira e que o bispo anda a gozar com a malta e o almirante Matias afinal é que tem razão?
Ou podemos, enquanto rangemos os tridentes de raiva, contabilizar isto como um donativo generoso que estamos a fazer à Alemanha para adquirimos o direito a sair do humilhante grupo dos PIIGs?

2010/07/31

Chumbos

O governo pretende, ao que parece, acabar com os chumbos no ensino. Confesso que não tenho certezas sobre esta medida, como não tenho certezas sobre a continuação dos exames. Mas, tenho umas quantas certezas sobre outros assuntos. Em primeiro lugar, tenho a certeza que esta medida, como outras deste governo, a ser implementada, correria o risco de, passado algum tempo, ser anulada, voltando tudo à primeira forma. Tem sido o modo de governar deste executivo. Primeiro, mandam o barro à parede, se pegar fica, se não pegar remove-se. Tudo depende do barómetro das sondagens e da "conjuntura" política... É isto o "programa" de governo e é assim que uma série de incautos vai mantendo a crença que o primeiro ministro é um "determinado" e alguém cheio de coragem.
Já a reacção da oposição traz-me à mente os filmes do Borat. As situações criadas por este personagem são tão embaraçosas que nem sequer dão vontade de rir. Deixam-nos incomodados. De entre os argumentos que ouvi para contestar a proposta do fim dos chumbos destaco dois: acabar com eles é um ataque à meritocracia e não contribui para preparar as gerações futuras para o mercado de trabalho competitivo.
Ouve-se e pasma-se!
Esquecem os cavalheiros que cantam estas melodias enganadoras, usando o argumento do mérito, que não basta tê-lo, é preciso que seja reconhecido. Podem os alunos ser sujeitos a todos os exames e testes possíveis e imaginários, podem-se criar todas as escalas possíveis para aferir a sua resposta a estes testes e exames porque no final vai sempre faltar o reconhecimento, na prática, do mérito. De há muitos anos que o mérito está perfeitamente hierarquizado, que sabemos perfeitamente quem o tem e quem o não tem. Desprezamos os primeiros e promovemos os segundos. Até lhes damos lugares de topo no Estado! E sabemos mais! Sabemos que quanto mais mérito tivermos mais nos vão às canelas! Os meritosos acabam emigrantes...
Esquecem-se os cavalheiros que cantam estas melodias enganadoras, usando o argumento da competitividade, que mais do que preparar os mais novos para competir, interessa ao país prepará-los para cooperar. A competir já andamos todos, cada uma para seu lado, a espernear e a tentar sobreviver nesta sociedade onde as palavras solidariedade e cooperação foram de há muito banidas do dicionário, sem acordo ortográfico nem piedade. Seria interessante experimentar a colaboração e a solidariedade entre todos para resolvermos os nossos problemas, porque assim, a competir, está provado que não vamos lá.
Estão, pois, todos chumbados. Pena termos de gramar os repetentes...

2010/07/29

Uma vitória de Pirro (2)

Afinal, a "golden share", que era tão importante para os interesses nacionais, já não é importante e, como era previsto, o governo congratulou-se com negócio da PT na Vivo...O que, em linguagem futebolística, pode ser traduzido pela máxima "o que hoje é verdade, amanhã pode ser mentira".
Mas, alguém ainda acredita num primeiro-ministro, que um dia diz uma coisa e, no dia seguinte, o seu contrário?

2010/07/24

O cestinho

Portugal atravessa hoje uma crise que todos somos obrigados a reconhecer. Muitos atribuem a origem dessa crise, não a aspectos conjunturais resultantes de problemas financeiros originados por um qualquer desacerto de gestão, doméstico ou ocorrido alhures, mas a aspectos estruturais, a uma crise, sim, mas de identidade e de rumo do país. Têm razão.
O país está como aquelas criaturas que vemos por aí vivendo ao sabor das circunstâncias, sem desígnio, virando-se para onde "estiver a dar".
Todos nós conhecemos certamente muita gente com projecto de vida, muita gente determinada e lutadora, muita gente que vive vida própria, independente, mas o país, esta entidade colectiva, não tem direcção, nem independência.
Não é a crise do subprime ou o problema da dívida soberana que nos corrói. É, de facto, a total falta de rumo colectivo. Todos os outros problemas vêm daí.  
Não me perguntem a mim o que fazer porque eu sou só compositor... Mas, perguntem aos imbecis que nos dirigem, aos que detêm o poder e aos que vigiam o exercício desse poder, o que raio andam eles a fazer! 
Deixa-me verdadeiramente entristecido ver que face às imensas dificuldades, ao aprofundamento das desigualdades e à manifesta ausência de soluções competentes, as entidades oficiais e organizações civis se remetam a uma lógica de mão estendida.
A Igreja Católica não encontra melhor solução do que pedir o dízimo aos fiéis, neste caso, a solução ridícula do tal fundo para acudir aos "mais necessitados". É claro que a Igreja tem sempre esta solução fácil de fazer passar o cestinho para a malta lá deitar umas moedas. Não se interroga sobre a origem dessas moedas, nem dá na sua doutrina valor ao modo como foram ganhas. O dinheiro, para a Igreja Católica, cai literalmente do céu. Como, enquanto instituição, não cria riqueza, a solução que encontra para quando a massa começa a faltar é passar o cestinho. 
Não me espanta, pois, (embora me choque...) o apelo do bispo Carlos Azevedo. Mas, espanta-me e choca-me o apelo do Ministro das Finanças às agências de rating para que tenham em conta os resultados dos stress tests à banca portuguesa nas suas avaliações futuras. Apelo compungido, sente-se-lhe mesmo a genuflexão. Para quê? Para podermos continuar a pedir dinheiro, mas este sair mais barato. A variante laica do cestinho dos católicos. Espanta-me que o ministro português faça apelos desta natureza depois de ter desacreditado por palavras a acção dessas agências e choca-me que não faça, enquanto responsável governamental, acompanhar este apelo de uma nota do género "eu digo isto, mas alerto os portugueses para a necessidade que temos de criar mais riqueza para não ter de andar a mendigar no estrangeiro." E envergonha-me não o ouvir anunciar medidas. Devemos gerar a nossa própria riqueza, devemos construir juntos um plano para superar os nossos problemas e encontrar os mecanismos para o concretizar. Mas, não ouvimos desde há muito, muito tempo uma palavra sequer sobre nada disto, nem uma ideia e muito menos uma medida para estimular a criação de riqueza.
Não é só a oposição, é o governo também que anda ao sabor dos ventos, sem um desígnio mobilizador. E não é problema de hoje, é coisa antiga, de décadas.
Em suma, nada, nem um projecto sequer.  Limitamo-nos a passar o cestinho quando é preciso, que seguramos com uma mão enquanto com a outra seguramos as calças para não cairem.  
Como é que alguém que tem uma qualquer forma de poder nas mãos consegue verdadeiramente sentir-se com a sua consciência limpa quando se limita a estender o cestinho ou a pedir que o passem? 

2010/07/23

O exemplo alemão

A Alemanha é apontada geralmente como o país austero, das boas contas, da grande exigência e rigor. É também tido como o país do trabalho colectivo, preciso e organizado. Uma máquina, dizem! Os alemães pensam como um grande colectivo, remando aparentemente todos para o mesmo lado.
Instalada a crise internacional, a Alemanha apressa-se logo a marcar terreno impondo a si própria medidas de apertado controlo financeiro e tratando com sobranceria os países em dificuldade (o caso da Grécia, por exemplo), sugerindo medidas aos outros países, receitando sanções e castigos indizíveis diversos a quem não siga o seu exemplo de austeridade e persista na via financeira pecaminosa.
Não é que, vejam lá como as coisa são, a popularidade da senhora Merkl caiu entretanto para os níveis mais baixos de sempre?!
Se calhar, é abusivo ver aqui uma relação de causa-efeito. Se calhar, as medidas até serão consideradas insuficientes. Mas, também é legítimo imaginar que o povo terá ficado desconfiado destes, que agora reclamam tanta austeridade, por terem feito vista grossa ao facto de uma parte do buraco financeiro dos países em dificuldade ter sido comprada pelos austeros bancos alemães... Austeros bancos alemães estes que não quiseram contudo deixar de dar uma perninha no regabofe financeiro internacional, deixando a máquina alemã em pane e a precisar de manutenção. Vamos ver o que dizem os stress tests sobre os bancos alemães.

2010/07/22

Com este PSD assim vamos continuar a ter de gramar o PS...

Antes de mais nada há que perguntar por que raio vem toda esta histeria com a pretensa revisão constitucional?! É uma pergunta que deixo à imaginação dos leitores do Face. Ocorrem-me várias explicações, umas mais delirantes do que outras, mas deixemos por agora o assunto.
O que fica de tudo isto? O PSD quer liberalizar ainda mais os despedimentos. Ponto, parágrafo. É este o fim último da "estratégia" de revisão proposta. Como diz Carvalho da Silva "a Constituição é clara nesta matéria" e o que o PSD quer é, com cambalhotas de retórica capciosa, mas saloia, subverter simplesmente o princípio constitucional. Para quê, pergunta-se? Remeto para o primeiro parágrafo...
Sugerir, contudo, numa altura em que os trabalhadores e a população em geral vivem sobre as brasas da precariedade, numa altura em que diariamente fecham empresas e se anunciam constantemente novos despedimentos (ontem foi a Charles a anunciar o fecho das suas lojas e o despedimento de mais duzentos e tal trabalhadores), que seja possível despedir por "razões atendíveis", só pode ser equívoco, provocação ou piada de mau gosto... 
Já é possível despedir por "razões atendíveis", como é fácil constantar pelos números do desemprego. O PSD acha que não e  justifica a proposta... com o desemprego existente. Cuja causa atribui à dificuldade em despedir! É uma coisa absolutamente delirante, nunca se viu nada assim. 
À falta de um desígnio para o país (o primeiro ministro não se cansa de repetir esta ideia e, neste capítulo, convenhamos, tem razão...) , o que o PSD vem propôr é a captação de investimento para pagar os desmandos da república à custa de um regabofe ainda maior em matéria de despedimentos. Pior do que o que se passa agora, estão a ver?
Transformar o mercado de trabalho português numa espécie de enorme Feira de Carcavelos do Laboral, onde qualquer mafioso possa, simplesmente, vir explorar a mão de obra para canhão que temos, oferecendo condições ainda mais precárias de trabalho, sem estratégia, sem horizonte, sem valor acrescentado. Eis o grande desígnio do PSD para o País. PSD que, certamente empolgado com estas habilidades, faz soar alto as trombetas todas e cerra fileiras como se estivesse prestes a investir contra o turco! 
Deu contudo o PSD um valente tiro no pé. Conseguiu fazer o PS aparecer como um partido de esquerda, defensor dos valores do regime nascido em Abril de 74... Aparecer não como o partido culpado que é pelo estado a que chegámos, mas como defensor das vítimas que ele próprio fez. Dá vontade de rir ver o PS, a atacar com indignação as propostas do PSD. O mesmo PS que tem feito tudo para tudo mudar, sem precisar de rever a constituição e sempre com o acordo tácito do PSD. É patético! 
A sofreguidão com que o PS aproveitou esta escorregadela brutal de Passos Coelho, reagindo às propostas do PSD com enorme rapidez e metendo os seus pesos pesados todos a atacar a proposta social-democrata nos telejornais, ao vivo e em simultâneo, diz bem como a agência de agitprop do PS funciona. O PS sabe que o tempo não joga a seu favor e agiu rápido. A fogosidade de Passos Coelho traiu-o e fê-lo dar um trambolhão. Dentro de algum tempo os que agora aplaudem estas propostas vão receber a factura desta operação desastrada e a guerra dentro do PSD vai voltar a estalar. Tanto que o jovem prometia... O PS e o PSD devem estar agora a perceber os supreendentes elogios do dr. Soares ao novel cunico-presidente.
No meio disto tudo, os partidos da esquerda parlamentar parecem, pela reacção pífia que tiveram em relação a tudo isto, ter ido já de férias e o CDS lá se vai safando, marcando pontos preciosos ao fazer o discurso desta esquerda em aparente vilegiatura. O dr. Passos Coelho devia aprender umas lições de estratégia com o dr. Portas.

2010/07/15

A rua da ignorância

Na mesma semana em que a universidade do México prepara uma homenagem a Saramago, a Assembleia Municipal do Porto vetou o nome do escritor para uma rua da cidade. Certamente inspirado por Sousa Lara, o autarca Rui Rio vai ficar na história pela pior das razões: a ignorância.

2010/07/11

Parabéns ao polvo!

Pese a resistência holandesa, a vitória espanhola é indiscutível. Ganhou o melhor futebol. Até o polvo alemão já tinha percebido o óbvio.

2010/07/09

Uma vitória de Pirro

Com seria de prever, o Tribunal Europeu de Justiça declarou inconstitucional a utilização da "golden share" portuguesa na PT, que inviabilizava o negócio da compra da Vivo pela Telefonica. Voltámos, assim, ao princípio e não tardará muito que a multinacional espanhola venha a concretizar o negócio que há muito tempo desejava.
Valeu de alguma coisa o gesto nacionalista e patriótico de Sócrates? Aparentemente, não, ainda que, em termos financeiros, possa significar um maior encaixe do que aquele que seria previsível sem a utilização da "fatia dourada". Derrotado no campo jurídico, ao governo mais não restará de que argumentar que, desta forma, também defendeu os interesses dos accionistas. Isto porque a PT continua a ser considerada uma empresa estratégica no desenvolvimento económico de Portugal e, como tal, deve continuar "portuguesa". Aparentemente, o argumento faz sentido. Mas, se a PT é estratégica para a nossa economia, porque não nacionalizá-la? É esta contradição, aparentemente insanável, que o governo "socialista" de Sócrates não é capaz de resolver.

2010/07/03

"Tudo o resto é hermenêutica"

Alberto Manguel é um autor por quem tenho uma especial admiração. Numa excelente entrevista publicada ontem no Público, quando lhe perguntam se pensa que a leitura está a perder terreno, responde "O que está a perder terreno é a inteligência. Estamos a tornar-nos mais estúpidos porque vivemos numa sociedade na qual temos de ser consumidores para que essa sociedade sobreviva. E para ser consumidor é preciso ser estúpido."
Não sei se a Ministra da Cultura percebe perfeitamente o que significa ocupar um cargo de Estado e se sabe do que fala quando usa a expressão hermenêutica no seu artigo "Cultura sem hermenêutica", também ontem vindo a lume no Público.
Mas, sei que esse artigo confirma a total justeza do comentário de Manguel.

2010/07/02

"Façam sopa!"

Prossegue a nova telenovela "Ao Vivo com a Telefónica". Os accionistas não querem saber do valor estratégico da PT. O Governo decide ditar a política de gestão da empresa. Se tem valor estratégico por que razão está na mão de privados? Se deixaram que se tornasse privada por que razão o governo decide intervir?
O valor estratégico da empresa resume-se --uma ideia chave que me parece consensual-- à sua capacidade como empregadora e criadora de mais valia tecnológica inovadora. A Vivo só estorva neste contexto. Vamos inovar tecnologicamente para a Vivo? É isto o valor estratégico da PT?
A inovação e a mais valia tecnológica constituem um activo que não tem limite e pode ser rentabilizado até ao infinito. A Vivo limita o desenvolvimento estratégico da empresa. Os espanhóis querem a Vivo e oferecem pela empresa praticamente o que vale PT. Os portugueses acham que sem a Vivo voltam ao campeonato da 2ª divisão. O sentido de "inovação" e a dimensão do seu conceito de futuro revelam-se em todo este processo: passa por vender chamadas aos brasileiros.
Eu cá nem hesitava. Vendia já a Vivo, criava uma PT fornecedora de mais valia tecnológica inovadora e comercializava-a. Se calhar, vendia-a à Vivo, à Telefónica e a quem mais dela necessitasse. Com a massa feita pela venda criava um grande centro de inovação tecnológica, uma coisa mesmo a sério num projecto com dimensão. A PT é talvez a empresa que está melhor colocada para corresponder aos desafios que se colocam a Portugal.
Mas, sair da "crise", pelos vistos, para estes dirigentes é obrigar uma das maiores empresas nacionais a remeter-se ao papel de vendedor de chamadas a brasileiros e assim ir criando mais valias financeiras que vão enganando o défice... Eis o significado de estratégia.
Por aqui se vê o que valem a ambição, a visão, o sentido de voo e de valor acrescentado e os grandes desígnios de todas estas aventesmas que nos dirigem politicamente. O que vale o discurso tipo Magalhães.
Por aqui se vê também o que vale a crítica dos críticos deste governo, porque ainda não vi ninguém insurgir-se contra esta tendência para o voo rasteiro e esta ambição que se fica pela criação de pacotes de chamadas para brasileiro comprar. De uma forma ou de outra (a favor ou contra a golden share), os partidos querem é vender chamadas. Todos unidos contra os espanhóis! Este caso convocou os fantasmas de Aljubarrota e até criou um inusitado grupo de "bed fellows", como se diz em inglês.
É isto Portugal hoje. O TGV avança, para logo recuar, os chips avançam para logo recuarem, a retroactividade dos subsídios na cultura avança para logo recuar. E agora, para completar o ramalhete, a PT transmite a Vivo em diferido.
Hoje o PM achava que perante um novo recorde da taxa de desemprego está tudo na maior, a Ministra da Cultura defende a venda da hermenêutica também quiçá aos espanhóis, ou mesmo aos brasileiros, e a Ministra da Saúde manda, de forma grotesca, a malta  "fazer sopa", para, aproveitando a crise, não engordar.
O pior, de facto, que poderia acontecer seria deixar os portugueses engordar...

2010/06/30

Estado Português 1 - Telefonica Espanhola 0

Cá se fazem, cá se pagam...

The Island

Hoje ouvi o senhor Procurador Geral da República barafustar contra "os portugueses" porque dizem mal de tudo. Ele é a saúde, a justiça, a educação, nada está bem para "os portugueses", segundo o senhor PGR.
Como se depreende das palavras do senhor PGR está, pois, tudo uma maravilha, o que está errado... são os portugueses.
Pois senhor PGR, há que dizer que V. Exa. está totalmente equivocado. Fosse isto um país a sério e não a infeliz opereta de que V. Exa. é um dos protagonistas e talvez V. Exa. estivesse já há muito fora do elenco, ou talvez nem nele tivesse mesmo entrado.
Repare V. Exa. no seguinte. A minha mãe tem 95 anos e foi há pouco operada a uma fractura do fémur, num hospital recentemente inaugurado com pompa e circunstância. Ainda mal lhe tinham tirado a máscara da anestesia já a ameaçavam com alta, porque "hospital não é asilo", sic! Mas, adiante...
Ora, hoje fui com ela a uma consulta nesse hospital recentemente inaugurado, com pompa e circunstância. Lá chegado dirigi-me ao serviço para requisitar uma cadeira de rodas
Será fácil imaginar que a minha mãe não está em condições de percorrer os longos corredores desse magnífico e novo hospital, inaugurado com pompa e circunstância...
A funcionária do serviço informou-me que durante o fim de semana a sala onde se encontram armazenadas as ditas cadeiras de rodas tinha ficado aberta e que as urgências deste magnífico hospital,  inaugurado com pompa e circunstância, tinham vindo sacar à sorrelfa todas as cadeiras disponíveis. A solução, dizia-me a solícita funcionária, seria eu ir ao serviço de urgência (um outro edifício, longe deste onde me encontrava) recuperar uma das cadeiras surripiadas, em pleno fim de semana, do serviço de consultas do moderno hospital.
Como fazê-lo? Onde iria eu deixar a senhora enquanto participava na operação de resgate da cadeira surripiada? Onde a iria sentar entretanto? Não podendo aceder à sugestão da dita e gentil funcionária lá tentei resolver o assunto como me foi possível. Acaba sempre por haver uma maneira, ou não fossemos nós conhecidos pelo desenrascanço.
Já na sala de espera, à falta de cadeiras de rodas, havia dois monitores que passavam, sem cessar, imagens obsessivas, felizmente mudas, do primeiro ministro e do presidente do conselho de administração do dito hospital inaugurado com pompa e circunstância, acompanhadas de sequências onde se podia ver o hospital em funcionamento quase idílico, tudo brilhante e funcional, e o slogan "A saúde da nova geração" a aparecer em momentos cuidadosamente cronometrados.
As imagens faziam-me lembrar aquele filme chamado "The Island", não sei se viu. Era tudo branco e luminoso. Os personagens das tais imagens idílicas sorriam de felicidade. Dos seus dentes soltavam-se pequenas estrelas.
Neste hospital não está tudo mal. Melhor seria! Mas, são pormenores como este que lhe descrevi que juntando-se a todos os outros levam a dizer que está tudo mal. Infelizmente, situações como esta multiplicam-se com uma frequência indesejada. Uma só já seria demais. E a solução acaba sempre por cair em cima do cliente. Seja nos desmandos da banca, seja nos da administração pública, seja nas cadeiras de rodas. O cliente desta unidade de "saúde de nova geração" que vá buscar a cadeirinha que uma organização deficiente permite subtrair...
Nos monitores da sala de espera aparecem os responsáveis por tudo e é isso que levará os utentes a pensar que tudo está mal. Pois se o primeiro ministro e o administrador-mor aparecem nos monitores da sala de espera a dar a cara por uma unidade hospitalar tida como exemplar, ainda com cheiro a tinta fresca e a gente quer uma cadeira de rodas e ela foi palmada, o que quer V. Exa. que a gente pense? Se eles são os responsáveis por tudo, e isto acontece, está tudo mal!
É como V. Exa.. Tivesse V. Exa. pensado melhor, senhor PGR, e talvez a simples ideia de que o cliente poderá por certo ter alguma razão o obrigasse a temperar as declarações. Tivesse V. Exa. pensado que o cliente lhe paga o ordenado e que tanta queixa poderá, poderá!, acabar mesmo por ter fundamento e teria V. Exa. ficado calado. Levasse V. Exa. a sua função a sério e talvez os alvos do seu comentário se invertessem. Outros alvos seriam objecto da sua intervenção. Por isso a gente pensa que a PGR está toda mal.
Não estamos todos (ainda) na Island... Mas, pagamos já todos os altos custos da insularidade.

2010/06/27

Swiss-brazuca


Este desporto da febril troca de videos do Youtube que grassa por aí traz-nos, por vezes, surpresas. É raro, mas acontece. Um amigo chamou-me há tempo a atenção para o video anexo (Top Secret Drum Corps, de Basileia - Suiça), adicionando o comentário: "parecem brazucas disfarçados"...
É preciso ver o video para compreender a expressão, que é, de facto, totalmente apropriada.
Para honrar o comentário criei o singelo poema que aqui vos deixo. Dedico-o ao querido amigo que me deu isto a conhecer e, em pleno espírito do Mundial 2010, a todos os sopradores da vuvuzela por esse mundo fora... Que o som dela vos traga os piores pesadelos!
Assim se dá oficialmente início à silly season aqui no Face.


Swiss-brazuca

Misto de precisão tresloucada!
Relógio que tiqui-tiqui-táka!
Tikitikitikiti!
Tá-tá-boom-boom!
Acarajé de chocolate!
Edelweiss do Pantanal!!
É Wilhelm? No telling...
É Guilherme? More likely!
Eh suiço ruim!
Nestlé-té-té-ré-ré!
Eh brazukas dos alpes!
Pauliteiros de pulso e de bolso.
Cangaceiros da confederação helvética do Piáui!!
Yodelériti-ti-ti-ti-taka-dadabum-bum!
A conta é secreta?
Que grande forró.
Cuíca não é cantão!
Tem mania d'arrumação?
Samba tem precisão?
Não, é anal na retenção.
E é neutral de coração...
Saravah, meu'irrrrrmão!!

2010/06/26

A crise portuguesa em perspectiva

Agora que alguns dos principais responsáveis da crise portuguesa actual se desdobram em recados por interpostos figurantes - procurando minimizar o seu papel nas políticas económicas dos últimos anos - é bom lançar alguma luz na cacofonia local e vermos a crise nacional em perspectiva europeia. A BBC fez o trabalho de casa e os resultados podem ser vistos aqui. Comentários, para quê?

2010/06/19

Fuso Luso 6


A 64º de latitude, estou nos limites da "ocidentalidade" a norte. Se continuasse a percorrer este meridiano em que me encontro, desse o pequeno passo que falta para ultrapassar a latitude 90º e me desviasse uns 70º para a minha direita, iria com toda esta facilidade e por uma via muito mais curta (se os navegadores soubessem...) tombar no outro lado, num outro norte, situado nas mesmas latitudes da ocidentalidade, mas com diferenças maiores do que a simples diferença entre o dia e a noite. Deste lado de cá não percebemos que há ali  uma vantagem ancestral. É aquele lado que primeiro vê o dia nascer. Eles sabem isso, sabem  a vantagem que têm e demonstam uma paciência sábia perante a nossa impaciência atrevida.
Ainda assim, apesar de percorrermos outras longitudes, continuamos a falar de norte. Se continuarmos, porém, a progredir ao longo deste mesmo meridiano em que me encontro (se os navegadores soubessem...), à queda do norte ocidental num norte oriental juntar-se-ia o trambolhão no sul. Onde nos vamos estatelar todos a sério!
Nestas latitudes remotas onde me encontro percebe-se melhor o quanto a ocidentalidade vive auto-convencida e alheada destas verdades meridianas.
Quando acordar arrisca-se a ser tratada com o mesmo respeito que Johan Ludvig Runeberg --o poeta nacional da Finlândia, representado na estátua da foto-- merece à gaivota nela pousada.
Não foi Gandhi que disse, a propósito da "civilização ocidental", que achava que seria uma boa ideia...?
E Portugal? Como vai lidando com todos estes problemas? Na região do fuso luso, esta dança dos quadrantes vai sendo tratada com a costumeira "astrolábia" dos dirigentes políticos, navegadores de águas chocas, desconhecedores do regime dos ventos, da força das marés e das regras da mareação actual. A marujada, por seu turno, opta pela arte da navegação solitária, já que ninguém a consegue mobilizar para um rumo comum. E como navegar é (continua a ser) preciso, toca de levantar ferro.

2010/06/18

José Saramago (1922-2010)

"A morte voltou para a cama, abraçou-se ao homem e, sem compreender o que lhe estava a suceder, ela que nunca dormia, sentiu que o sono lhe fazia descair suavemente as pálpebras. No dia seguinte ninguém morreu"

(em "As Intermitências da Morte", 2005)

2010/06/16

Fuso luso 5

É impossível não ficar esmagado pela paisagem vista aqui da montanha de Koli. Uma paisagem que é enjoativa de linda. São onze da noite e o sol brilha. Esmagado pela paisagem (não me esmagam facilmente!), baralhado pelo sol da meia noite e pela estafa da viagem, ainda tento perceber a verdadeira natureza destes finlandeses, as linhas que separam a Nokia da total e generalizada incompetência dos funcionários do aeroporto, a fronteira entre o acolhimento quente e jovial e os silêncios gélidos e prolongados (quem não ficaria silencioso e gelado perante a imensidão desta beleza?), a divisória entre a internet que jorra generosamente à borla por todo o lado e a televisão cobrada nos quartos do hotel a preços exorbitantes.
Sibelius passou por Koli e inspirado certamente, como eu fiquei, por uns retemperantes 6º C ao meio dia a meio de Junho, escreveu a sua 4ª sinfonia.
Não sei se vou conseguir arranjar tempo para escrever a minha quarta sinfonia, porque ainda me falta escrever as primeiras três, mas que estou inspirado lá isso estou.