2025/01/09

Taxi Driver (36)

Edifício J: O Novo Campus de Justiça da Cidade, Descubra o emocionante  universo de site de apostas jogos futebol - vitis.sk

Boa tarde, para onde vamos? 

- Para o Campus da Justiça, sabe onde é? 

No Parque Expo, certo?

- Sim, é para renovar o passaporte.

Ah, já sei. Foi lá que renovei a minha carta de condução. Penso que é no edifício J. 

- Isso mesmo, é uma Loja do Cidadão. Podia ir à Loja das Laranjeiras, que é mais perto, mas está sempre cheia e funciona por senhas. Na Campus da Justiça, já tenho marcação para hoje. 

Não se meta nas Laranjeiras. Aquilo está sempre cheio de "monhés", carregados com papéis, a tratar de licenças de estadia e contratos de casas. Depois, quando têm os papéis, vão viver aos 10 e aos 20, para uma casa, onde pagam 100 euros por uma cama, mas eles não se importam porque estão habituados a viver à "molhada". Muitos nem trabalham...

- Vivem ao "monte", porque ninguém lhes aluga casa e as rendas são caríssimas. Nem os portugueses conseguem arrendar casa em Lisboa, quanto mais os imigrantes pobres! Que culpa têm os imigrantes, que o estado português, que necessita deles, seja mal organizado e mande vir estrangeiros sem lhes dar apoios mínimos? Eu também fui emigrado na Holanda e ninguém vivia debaixo de pontes e tendas nos parques. Porque é que os responsáveis políticos e a polícia, permitem isto? Alguém ganha com este negócio. São as máfias dos empregadores e dos senhorios, para não falar dos advogados, que traficam tudo, a troco de dinheiro.  Os governos sabem e "fecham os olhos"...

Pois, é. Neste país, não se pode viver. Até a minha filha teve de emigrar.

- Tem uma filha emigrada? 

Tenho. É enfermeira. Cá, não se governava, foi-se embora. Agora estamos separados, mas ela está melhor. Aqui ganhava 1200 euros e lá pagam-lhe 4000 libras. Trabalha num hospital ao Norte de Londres, alojamento incluído. Tem um apartamento de 60 m2, com um quarto e uma cozinha aberta. Para uma pessoa, dá. Fui lá visitá-la. Está bem e vai a pé para o trabalho. Os preços no Lidl, do bairro onde mora, são os mesmos de cá. O senhor acredita? 

- Acredito. Falta organização aos portugueses. Não se conseguem organizar cá dentro, quanto mais os que vêm de fora. Já é assim há muito tempo. Com o aumento do turismo e o crescimento da economia, são necessárias pessoas para trabalhar em sectores onde os portugueses não querem trabalhar. 

Se pagarem melhor aos portugueses, eles ficam cá e não precisam de contratar imigrantes.

- Sempre houve migrantes em todo o Mundo. É um fenómeno mundial. O facto de virem pessoas para cá trabalhar é sinal de que a economia portuguesa está a crescer e necessita deles. Em si não é mau.

Pois não. Saiu um estudo há pouco tempo, onde dizem que 60% dos portugueses concordam com a imigração. Não podem é ser tantos e muitos não são de confiar. Eu não concordo com o Ventura, mas ele diz umas verdades. 

- O Ventura? É um fascista. Discrimina as minorias e diz que os ciganos não trabalham e vivem à custa do RSI. Toda a gente diz verdades. Até eu digo. É como os relógios. Duas vezes por dia, estão certos. O que é que isso prova?

Eu não voto no Ventura. Eu voto no PSD,  sempre votei. Não sou da extrema-direita. Mas, o que o Ventura diz dos ciganos é verdade. Vou-lhe contar uma história que se passou comigo: quando a minha filha foi para Inglaterra, disse-me para vender o carro dela, pois já era antigo e ela não ia usá-lo. Pus o carro à venda, até que um dia apareceu um cigano todo bem vestido e bem falante, interessado no carro. Mostrei-lhe o carro, ele deu umas voltas, voltou e disse-me que queria comprá-lo. Pedi 1500 euros e ele pagou em dinheiro. Dei baixa do carro, trocámos de documentos e ele foi-se embora. Passadas duas semanas, telefonou-me (com pronúncia de cigano) a dizer que o carro não estava em condições e que queria o dinheiro de volta. Eu recusei e ele ameaçou-me. Se não devolvesse o dinheiro, eu arranjava problemas. Durante uns dias, andei assustado, pois não sabia o que podia acontecer. Passado uns dias, telefonou outro cigano, amigo dele, a ameaçar-me de novo. Ou eu devolvia o dinheiro ou ia arrepender-me. Nessa altura, resolvi contactar um advogado conhecido e contei-lhe o caso. Ele aconselhou-me a tirar uma fotografia do seu escritório e mostrá-la ao cigano. Se ele me tornasse a ameaçar, ia para a prisão. Nunca mais me telefonou!

- Acredito, mas isso não prova que todos os ciganos actuem assim. O mesmo podia passar-se com outra etnia qualquer. Os criminosos não têm nacionalidade. É a mesma coisa que dizer, como o Ventura, que os ciganos vivem todos do Rendimento Mínimo. É mentira. 

É mentira? Têm filhos às carradas e vivem dos abonos de família, sem fazer nada. Muitos não pagam renda e até Mercedes à porta, têm. Do que é que vivem?        

- Isso é um mito, no qual as pessoas acreditam. Sabe quantos ciganos vivem em Portugal? Cerca de 40.000, segundo os dados de 2023. Representam 0,35% da população portuguesa! Sabe quantos recebem RSI? Cerca de 2000 ciganos, ou seja 3,7% da população cigana. Uma treta, que o Ventura conta aos portugueses e na qual só os ignorantes acreditam. Por isso, teve os votos que teve. Ninguém sabe nada. 

Não acredito, que sejam só 40.000. Eles fazem tantos filhos e a população está a diminuir? Esses números são falsificados. Não é permitido indicar a raça nos estudos que fazem, como é que o senhor sabe que são só 40.000? É como os indianos e os paquistaneses, que andam aí nos "ubers". Quantos são? Já ninguém sabe. Nem as autoridades sabem. Muitos nem sequer carta de condução têm.

- Isso é fácil de controlar. As licenças para conduzir um "uber" ou um táxi, devem ser iguais. A carta é um requisito. É como pagar renda de casa. Se têm casas sociais e não pagam renda, os serviços da câmara, podem expulsá-los. Eu, se não pagar renda durante dois meses, também tenho de abandonar a casa. Voltamos sempre ao mesmo. Os estrangeiros são convidados a vir para cá trabalhar e eles é que têm a culpa de que o estado português funcione mal? Sabe donde vêm os ciganos? 

Sei, vêm da Índia. Foram expulsos, por andarem lá a roubar. Ninguém gosta deles. Até os indianos da "uber", correm com eles, quando vêem algum na praça do aeroporto. Não admira, eles conhecem-nos bem...

- Nunca ouvi falar disso, mas pode ser verdade. Dou-me com alguns asiáticos e tenho a melhor impressão deles. Faço as minhas compras em estabelecimentos de bengalis e paquistaneses. Sempre amáveis e simpáticos.

Não se fie. Isso é porque o senhor é homem. Não respeitam as mulheres e abusam delas quando as transportam nos carros. As queixas são diárias. 

- Já ouvi falar disso, também. Não há evidência estatística de que isso é verdade. Quantos casos, quantas queixas? Penso que sabe que a maioria dos criminosos em Portugal são portugueses de origem. O número de criminosos estrangeiros presos, é mínimo, por comparação com os nacionais. 

Isso é porque escondem a nacionalidade dos presos. Para a justiça, os ciganos são todos portugueses...

- Pois são. Chegaram a Portugal no século XV e ficaram por cá. Até os expulsaram em 1562, durante a Inquisição, mas acabaram por ficar. Como os judeus, os africanos e outras etnias. Somos um povo com muitas origens. 

Olhe, estamos a chegar. Se quiser levo-o lá dentro, mas pode atravessar aqui, que é mais perto. O edifício J, é o último à direita. São 13,20 euros. Treze euros está bem, que eu não tenho troco. 

Muito bem. Boa tarde e bom trabalho. 

2025/01/03

Ano Novo, Vida Velha

Começou o ano. Como habitual, previsões não faltam. Um ritual, a que nenhum profissional do comentário se furta. Se as previsões não baterem certo, nunca será um problema. Afinal, os prognósticos mais acertados, sempre foram aqueles do fim do jogo.

Pior que as previsões, são as promessas. Poucas são cumpridas e, no caso de promessas políticas, menos ainda. Uma constante de todos os países em diferentes latitudes. "É o que temos", dirão os mais conformistas. Neste campo, Portugal, é paradigmático. Não passa um ano sem balanços do que (não) foi feito, apesar de sabermos de antemão o que falta (sempre) fazer. Dito de outro modo: os diagnósticos são conhecidos, só falta a obra! 

Se perguntarem a um português médio que problemas mais gostaria de ver resolvidos, a maior parte enunciará os habituais: saúde, educação, habitação e salários. Haverá outros (justiça, transportes, mobilidade, corrupção, imigração...), mas, as queixas, são semelhantes. A razão é simples: estes são os problemas básicos de qualquer sociedade e Portugal não é excepção. A diferença está na execução das medidas propostas que teimam em concretizar-se. Porque será?

Quando, há 50 anos, a democracia foi fundada, o programa do MFA assentava em três pressupostos claros e simples, os chamados "3 Ds": Democracia, Descolonização e Desenvolvimento.  Só os dois primeiros se concretizaram. O terceiro "D" continua por realizar, ainda que nalgumas áreas fossem obtidos sucessos inquestionáveis. Podemos dizer que o país está hoje melhor, mas também podemos afirmar que podia estar muito melhor, dados os meios postos à nossa disposição, nomeadamente através dos programas de coesão europeus, verdadeira cornucópia de subsídios dos mais variados tipos para diversas áreas, para não falar no turismo, uma industria que representa hoje mais de 10% do PIB. 

Veja-se o caso da saúde, certamente a maior preocupação dos portugueses. Apesar da criação do elogiado SNS, como explicar as lacunas existentes e a crónica falta de meios humanos e materiais, assinalados por tanta gente, dos utentes aos profissionais da saúde? Nunca, como nos últimos dez anos, se investiu tanto nesta área e, no entanto, as queixas são diárias. Como explicar que uma simples consulta possa demorar meses, quando não anos? Ou as inúmeras filas e horas de espera, nas urgências hospitalares? Para não falar da crónica falta de pessoal médico e dos serviços encerrados? Mais de 1,7 milhões de portugueses sem médico de família? Todos parecem saber as causas, mas os problemas persistem. Falta de dinheiro, falta de pessoal, salários baixos, má gestão?

Ou, o caso da educação. Cada vez que um governo toma posse, é grande a tentação de inovar. Desde  programas e métodos, aos livros utilizados, tudo tem de ser alterado. No entanto, não faltam alunos sem professores e professores desmotivados e em fim da carreira. Os resultados escolares ressentem-se desta caótica gestão e os índices internacionais (Pisa), não mentem. Continuamos mal em níveis de literacia e o abandono escolar é dos maiores da Europa. Uma questão salarial? Também, mas não explicará tudo.

Que dizer da habitação, provavelmente a questão mais premente nos dias que correm? Faltam casas e não se constrói o suficiente para as necessidades. O mercado de arrendamento é praticamente inexistente e o mercado de venda atingiu valores impagáveis. Um ciclo vicioso, agravado pela gentrificação dos centros históricos, convertidos em hotéis e alojamentos locais, o que torna a oferta ainda mais reduzida. Todos os governos sabem disto, todos prometem melhorar a situação, mas não se vê soluções. Há décadas.

A montante destas necessidades básicas, continuam os salários baixos, afinal uma das causas do nosso (sub)desenvolvimento. Durante anos, o patronato apostou num modelo competitivo de baixos salários, que há muito deixou de funcionar. Há duas décadas, que o crescimento económico não ultrapassa os 2%. Sem crescimento, não há distribuição. O país produz pouco valor acrescentado e os melhores quadros emigram para países onde lhes pagam de acordo com as competências obtidas. Emigram os mais qualificados e contratam-se imigrantes para fazer trabalhos que os portugueses não fazem, entre outras razões devido aos baixos salários praticados. 

Também nos investimentos, continuamos aquém das necessidades e dos projectos prometidos e ciclicamente adiados: novo aeroporto, linha TGV, ligações a Espanha, modernização da ferrovia, a lista é extensa. Obras intermináveis que começaram e foram interrompidas, ou que nunca se iniciaram. Qual a razão de tamanha incompetência?       

Enquanto a solução, para todos estes problemas, continua adiada, amontam-se os "estudos" e "pareceres" produzidos por comissões de notáveis, criadas pelos gestores da coisa pública, com o fim de agilizar processos e decisões que nunca mais chegam...

Foi assim no passado e, tudo leva a crer, continuará assim em 2025. Para o ano, cá estaremos, para  avaliar o que, entretanto, foi feito. Resta-nos a esperança, coisa que (dizem) nunca morre. Cinquenta anos depois, o 25 de Abril que nos prometeram, continua por concretizar. Provavelmente, tem tudo a ver com uma questão existencial. Aquela coisa que José Gil tão bem retratou no seu livro: "Portugal, hoje: o medo de existir". Será isso?